As grandes demissões em massa na indústria de tecnologia, conhecidas como “Tech Layoffs”, chamaram atenção em 2022 e continuam assustando os profissionais de TI após a virada do ano. Em forte contraste à movimentação do mercado indicando para um possível estouro de bolha, enquanto os economistas apontam para o início de uma recessão, temos recrutadores tentando preencher a demanda de vagas, que surge como superior ao número de pessoas capacitadas para ocupá-las.
As incertezas do mercado mundial, a guerra da Ucrânia, as contratações emergenciais durante a pandemia da covid-19 e a mudança no comportamento do público, seja consumidor, seja profissional, são pontos importantes para entendermos o momento que estamos vivendo e as transformações que teremos daqui para frente. O otimismo pela recuperação na retomada pós-pandemia não veio com os níveis pré-pandêmicos, conforme era esperado pelas empresas, e trouxe um nível de cautela ainda maior por conta da crise financeira global e a estagnação de muitos negócios.
Precisamos lembrar também que foi por conta dos bloqueios e período de quarentena, durante os piores picos da covid-19, que as empresas precisaram buscar por profissionais de tecnologia para atender à demanda de pessoas utilizando a internet para obterem por entretenimento, comunicação, educação e trabalho. No entanto, com a retomada das atividades presenciais, os consumidores passaram a rever seus gastos e otimizarem seus orçamentos mensais para sobreviverem às crises financeiras no Brasil e no mundo.
Ao analisarmos as mudanças no comportamento do consumidor, os acontecimentos financeiros globais e o crescimento desordenado do segmento na tentativa de atender à demanda latente durante os três últimos anos, conseguimos compreender os recentes planos de reestruturações e as mudanças nos negócios, tendo nas demissões em massa uma alternativa para cortarem gastos e se prepararem para qualquer possibilidade recessão.
Segundo o Tech Layoff Tracker, da TrueUp, tivemos mais de 241 mil demissões em empresas de tecnologia em 2022. Além dos anúncios feitos pela Amazon, Google, Meta, Microsoft e Salesforce, entre outras big techs, tivemos mais de 153 mil pessoas demitidas até agora, em 2023. No Brasil, o site Layoffs.fyi registrou demissões em mais de 100 empresas de tecnologia, sendo Loggi, PagBank e Loft com os maiores números, com mais de 26 mil profissionais dispensados de suas funções até o fim de janeiro de 2023.
Assim como o estouro da Bolha PontoCom em 2000, estamos presenciando uma alteração no comportamento das empresas que, além da mudança no comportamento e prioridade dos consumidores, pode estar fortemente relacionada aos altos salários que são pagos para esse perfil de profissional, com o rompimento de uma nova bolha em busca da regulamentação dos cargos, revisão das reais necessidades dessas posições para as companhias e assertividade na contratação.
Reiterando essa necessidade de rever as contratações de profissionais de TI e o plano de negócio com foco na aceleração digital, Max Nirenberg (Commit USA) afirmou, em entrevista à Spiceworks, que “muitas empresas de tecnologia que realizaram demissões em 2022 e 2023 administraram mal seus orçamentos, com a má formação de equipe nos anos anteriores, principalmente na tentativa de crescerem rapidamente ou ao estimarem quais habilidades seriam necessárias para serem contratadas em tempo integral ao lançarem um novo produto ou serviço”.
Prova de que as demissões em massa não estão necessariamente ligadas à possibilidade de recessão econômica são as oportunidades de emprego, que demonstram crescimento de 38% em 2023, atingindo 33 mil vagas, segundo a Forbes Brasil. O mesmo vale para o otimismo sobre o mercado brasileiro de tecnologias da informação e comunicação (TIC), com crescimento previsto em 5% para 2023, chegando a valer US$ 80 bilhões, segundo um novo levantamento da consultoria IDC (International Data Corporation).
Independentemente da resposta que obtivermos ao olharmos para todas essas questões, o mais importante para a nossa reflexão é que ela precisa estar direcionada ao valor do capital humano e sobre como podemos trabalhar com os profissionais de tecnologia de maneira mais eficiente. Cada vez mais alinhado ao plano de negócio e atendendo uma demanda real, pela peculiaridade dos perfis ou pela dificuldade de conquistá-los para se encaixarem na cultura e organização das empresas, as empresas e os recrutadores também precisam repensar estruturas, além dos formatos de prospecção, contratação e fidelização.
Carlos Carvalho é CEO da Truppe!
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