Esses dias encontrei uma preciosidade perdida no fundo de uma gaveta. Um presente que meu pai deu para mim e minhas irmãs quando éramos pequenas: um conjunto de botões tchecos azuis. Não eram botões comuns, eram como joias que ele espalhava em cima da cama e ficava imaginando blusas de seda na cor marfim que mandaríamos fazer para usarmos juntas. Era uma fantasia inocente, mas carregada de algo maior – um propósito de união e conexão sólida que ele queria criar entre as filhas. Curiosamente, eles nunca foram usados. Permaneceram guardados, como um sonho à espera de ser realizado.
Hoje, ao olhar para trás e pensar no simbolismo desses botões, vejo o quanto eles encapsulam o que chamo de “começar pelo porquê”. Esse conceito, desenvolvido por Simon Sinek, fala sobre a importância de iniciarmos qualquer projeto ou empreendimento com um propósito claro. Para Sinek, o “porquê” é a razão pela qual nos levantamos todos os dias, o que nos motiva a ir além e a fazer algo significativo.
No mundo dos negócios, especialmente no setor da moda, essa ideia do “porquê” é mais do que uma estratégia – é a essência de negócios com propósito. Assim como aqueles botões azuis, um negócio que nasce com uma intenção verdadeira carrega uma energia que inspira, conecta e dá sentido. Não se trata apenas de produzir algo ou gerar lucro, mas de criar um impacto duradouro.
No cenário atual, onde os negócios enfrentam desafios cada vez mais complexos, o propósito se torna um diferencial essencial. Marcas que se comprometem a ‘começar pelo porquê’ – seja por meio de práticas sustentáveis, inovação consciente ou responsabilidade social – vão além da simples venda de produtos; elas se tornam símbolos, criam histórias e estabelecem laços emocionais com seus consumidores.
As marcas ‘Challenger’, que questionam o status quo em mercados já estabelecidos, são um exemplo claro desse fenômeno. Marcas como Hoka, On e Veja, que têm propósito claro, estão desafiando gigantes do setor esportivo e criando conexões profundas e autênticas com seu público. De acordo com o relatório The State of Fashion 2025 do BOF Insights e McKinsey, espera-se que as ‘Challenger Brands’ representem mais da metade dos lucros no segmento de roupas esportivas em 2024 – uma prova do impacto duradouro de negócios guiados pelo propósito.
Os botões azuis, mesmo sem nunca terem virado as blusas que um dia planejei, continuam a me lembrar do seu simbolismo: o verdadeiro poder de um projeto – seja ele pessoal ou empresarial – está em seu “porquê”. Negócios com propósito são aqueles que ousam enxergar além do tangível, que transformam sonhos em histórias reais e que criam conexões que vão além do material. No final, é o propósito que nos inspira, nos une e nos move a fazer a diferença no mundo.
Cecília Rapassi é sócia-diretora da Gouvêa Fashion Business.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo.
Imagens: IA e Cecília Rapassi