O consumidor deseja cada vez mais consumir de marcas com as quais ele se identifique, com valores semelhantes aos seus. Sendo assim, marcas com propósito, com ações que contribuam para a melhoria da sociedade e do mundo em que vivemos são as que saem na frente no mercado. Para falar sobre marcas humanizadas, “Human Brands”, subiram ao palco do LATAM Retail Show, Renato Meirelles, presidente do Instituto Locomotiva e Rony Rodrigues, CEO e Fundador da Box 1824.
Renato comentou que é comum os empresários e varejistas de forma geral esquecem que os dados são relacionados a pessoas. Além disso, o consumidor mente, o que traz muitas vezes certa incoerência para as pesquisas.
O especialista destacou que os três principais vieses para onde resvalam as informações são: origem dos dados, que é quando as informações são influenciadas por fatos anteriores, como o incêndio na Floresta Amazônica que levou mais pessoas a se dizerem preocupadas com a floresta; o preditivo, que usa fatos do passado e ignora a possibilidade de mudança e inovação, acha que o que foi até hoje irá se manter; e a experiência imediata, que é influenciada por um fator externo recente, como o fatos de pessoas pesquisadas se considerarem mais felizes depois de apenas acharem uma moeda de um real no chão.
“Não é à toa que precisamos praticar a empatia. E se você se colocar no lugar do consumidor, a chance de conquistá-lo é muito maior”, destacou Renato.
É preciso entender que a sociedade brasileira passa por mudança. O brasileiro está mais escolarizado. O Brasil hoje tem 7,9 milhões de universitários a mais. “Há ainda o empoderamento crescente das mulheres, que veio para ficar. O machismo e a desigualdade ainda existem, mas 44% dos lares são chefiados por mulheres. A cada R$ 100 da renda de uma família, R$ 41, em média, são produzidos por mulheres”, explicou o especialista.
Outra mudança significativa é o envelhecimento dos brasileiros, o que gera uma mudança do perfil do consumidor. E cada vez mais pessoas se identificam como negros, o que representa uma transformação, embora eles ainda “estejam longe da publicidade e do desenvolvimento das marcas”, destacou Renato. Os brasileiros estão mais conectados, mas, por outro lado, há incoerência porque só um terço dos brasileiros com mais de 50 anos de idade acessam a internet e eles serão a maioria dos consumidores.
Quatro em cada cinco brasileiros se consideram parte da classe média. Para Renato, isso acontece “porque todo mundo conhece uma pessoa que tem mais grana e outra que tem menos que ele”. Mas é interessante porque a grande maioria da população brasileira tem renda pouco acima dos R$ 2 mil. Isso demonstra a influência do meio nas respostas dadas em pesquisas.
O especialista acredita que as mudanças na sociedade vão impactar diretamente nos padrões de consumo. Um exemplo são as mulheres, que hoje têm menos filhos e trabalham mais, gerando, por exemplo, uma mudança do padrão de compras de roupas, porque elas adquirem mais trajes voltados para o trabalho.
Além disso, hoje os consumidores visitam muito mais canais de venda. “70% passaram a visitar pelo menos três canais de compra. Sendo assim, só vão sobreviver os varejistas que têm uma clara proposta para oferecer”. Os brasileiros estão mais exigentes. “81% dos consumidores de hoje afirmam dar mais importância à qualidade do que no passado. O produto baratinho que se vendia antes não vai mais funcionar”, esclareceu Renato.
O especialista resumiu este cenário complexo destacando: “Não dá mais para usar os padrões do século XX para entender o consumidor do século XXI”.
As marcas precisam ter os mesmos valores que os consumidores para sobreviver. “O varejo vai precisar se reconectar com o consumidor ou vai sacrificar o seu lucro. Mas vai falar isso para os acionistas…”, provocou o especialista. Ele contou que segundo pesquisas, dois em cada três consumidores afirmam preferir marcas que tenham valores parecidos com os seus. “As pessoas não estão enxergando isso nas marcas”, alertou. Durante um estudo para comprar os valores das pessoas e das marcas, a única coisa que os consumidores consideram que as marcas têm a mais que eles em termos de valor foi o dinheiro. Diante deste cenário, é natural que mais de 63 milhões de brasileiros não se identifiquem com nenhuma marca varejista.
O sentimento geral das pessoas em relação ao mundo de hoje é o de sobrevivência. “Não é a toa que o uso de medicamentos contra depressão e ansiedade está crescendo, assim como o índice de suicídio. Várias cidades estão fazendo campanhas de conscientização para preveni-lo”, disse Rony.
As pessoas sofrem cada vez mais com o estresse, hoje chamado de burnout. Diante de uma vida cada vez mais corrida e estressante, as marcas estão se voltando para quatro tipos de promessas feitas para o consumidor. Algumas são voltadas para a descompressão, convidando o consumidor a relaxar. “Lojas como a Selfridge oferecem espaços de descompressão. São locais vazios, que convidam as pessoas a sentar e meditar um pouco”, disse Rony.
Outras empresas que estão se saindo bem são as voltadas para a performance, convidando o consumidor a se superar e ir para frente. Outras são voltadas para o sonho, a fuga da realidade. É o caso, por exemplo, da Gucci. “O que vemos nas propagandas deles são jovens lindos vestindo roupas maravilhosas”. O último grupo é o das marcas voltadas para a realidade, gerando uma reflexão realista e pragmática. Companhias como a Nike são hibridas, pois embora convide o consumidor a se superar por meio do esporte, gera uma reflexão, trazendo provocações sobre a sociedade. “Essas são as promessas que fazem conexões extremamente verdadeiras com as pessoas”, afirmou Rony, provocando com a frase: “Marcas são versões melhores de nós mesmos”.
* Foto: Terassan Fotografia