A disputa entre Estados Unidos e China trará impactos para a economia mundial. Estamos ainda na segunda década do século e não sabemos quem será a grande potência destes cem anos. Não sabemos se este século será o século da China, dos Estados Unidos, bipolar ou multipolar. Esta é uma das grandes questões do momento, de acordo com Cláudia Trevisan, pesquisadora do Instituto de Política Externa da Escola de Estudos Internacionais Avançados da Universidade Johns Hopkins e jornalista, durante o Retail Executive Summit, evento realizado pela GS&MD em Nova York para complementar os aprendizados do NRF Retail’s Big Show.
“Antes do fim da década que se inicia agora, a China vai ultrapassar os EUA e se tornar a maior economia do mundo. Para vocês terem ideia da dimensão histórica deste fato, a última vez em que uma economia perdeu o lugar para a outra foi em 1871, quando os Estados Unidos ultrapassaram a Inglaterra e se tornaram a maior economia do mundo”, esclareceu a especialista.
A mudança deve ser extremamente turbulenta. Cláudia explicou que nos últimos 500 anos, houve 16 ocasiões em que uma potência emergente desafiou uma potência estabelecida. Dessas, 12 terminaram em guerras, em uma dinâmica chamada Armadilha de Tucídides (historiador da Grécia Antiga). Aparentemente, esta dinâmica está presente na disputa entre EUA e China. “A grande questão hoje é se os dois países conseguirão evitar a Armadilha de Tucídides”, disse Cláudia.
A pesquisadora destacou que, embora a China esteja assumindo uma posição econômica muito importante, “os Estados Unidos continuam a ser a grande potência militar do mundo e essa posição ainda deverá ser mantida por um bom período. Além disso, conta com uma vantagem enorme, já que o dólar é a moeda usada na maioria esmagadora das transações financeiras globais”, explicou.
O principal ponto da disputa geopolítica entre EUA e China é a supremacia tecnológica. “A China é líder no 5G, que é uma tecnologia que será fundamental para o desenvolvimento de outras tecnologias; é líder em blockchain; em robótica e, na área de pagamentos, parece estar anos luz à frente de nós ou dos Estados Unidos”, resumiu Claudia.
A pesquisadora disse que uma grande preocupação é se o mundo irá viver outra Guerra Fria, com um rompimento entre as duas maiores potências do mundo. Ela destacou que quem acredita nesta separação observa que os modelos dos dois países se tornaram cada vez mais divergentes, principalmente após Xi Jinping assumir a presidência da China.
Por outro lado, Cláudia acredita que um rompimento entre as nações é muito difícil, devido à interdependência entre elas. “A realidade de hoje é muito diferente daquela da Guerra Fria de verdade, protagonizada por Estados Unidos e União Soviética. O comércio deles era de US$ 2 bilhões por ano. As trocas entre Estados Unidos e China somam US$ 2 bilhões por dia”, declarou. O país asiático é o segundo maior credor dos Estados Unidos.
Além disso, uma separação entre os países se torna mais difícil devido à ligação que possuem em relação às cadeias produtivas e empresas. O estabelecimento de áreas de influência separadas é pouco provável, já que “70% dos países hoje têm mais comércio com a China do que com os Estados Unidos. Em 2001, quando a China ingressou na OMC, 80% dos países tinham mais comércio com os Estados Unidos”, definiu Cláudia.
A pesquisadora refletiu que existem outras mudanças geopolíticas importantes acontecendo, o que torna a definição do que deve acontecer no mundo ainda mais difícil. Exemplos disso são o fim da PAX americana (domínio dos Estados Unidos após a Segunda Guerra Mundial), a volta da competição entre grandes potências, o enfraquecimento do multilateralismo, a volta do protecionismo, entre muitas outros.
Todas estas mudanças devem ter grandes impactos no Brasil. Os Estados Unidos foram o maior parceiro comercial do país, situação que mudou em 2009, quando o posto passou a ser ocupado pela China. A nação asiática também é uma das maiores investidoras estrangeiras no Brasil, estando em posição próxima ao líder, que é os Estados Unidos. Estes fluxos tendem a aumentar, com a proibição dos investimentos chineses nos Estados Unidos, sobretudo na área de tecnologia. Assim, os valores devem ser repassados para outros países, sobretudo nações emergentes como o Brasil.
* Imagem divulgação