A pandemia afetou diretamente todos os setores, que tiveram que se reinventar para permanecerem competitivos. Ao mesmo tempo, nesses quase dois anos desde o começo da crise sanitária global, os hábitos de consumo mudaram, assim como as tendências e o surgimento de novas prioridades na hora de comprar.
Como essas mudanças que ocorreram impactaram o varejo dos EUA e do Brasil e qual é o momento atual do setor. Esse foi o tema debatido por Marcelo Allain e André Sacconato, da Gouvêa Analytics, e Ricardo Contrera, da Mosaiclab, durante o Interactive Retail Trends – Pós-NRF, promovido pela Gouvêa Experience, braço de eventos da Gouvêa Ecosystem, no último dia 1 de fevereiro. O evento resume os aprendizados da NRF 2022 e mostra as perspectivas do varejo brasileiro sob a ótica de executivos e especialistas do setor.
Ricardo Contrera comentou sobre as mudanças geracionais e do comportamento do shopper e citou que os medos coletivos são os responsáveis por moldar os comportamentos futuros e as tendências globais. “Esses medos coletivos, aliados com as novas formas de relacionamento que tivemos e com aceleração da tecnologia, causaram um impacto físico e emocional em nossas vidas e trouxeram uma mudança de comportamento”, afirma.
Outro ponto que o CEO da Mosaiclab reforçou foi que a população passou por um processo de reflexão sobre os aspectos e valores de suas vidas e ficou mais exigente e participativa em todos os processos. Esse momento fez com que os consumidores repensassem suas necessidades, relações com as marcas e os impactos na natureza com seu consumo.
Contrera também trouxe para o palco dados sobre a pesquisa feita por Lee Peterson e apresentada na NRF desse ano, que indicou que 100% dos entrevistados desejam no futuro trabalhar de forma híbrida ou totalmente de casa. Esses números refletiram no consumo, já que 68% dos americanos, hoje, preferem consumir online.
Por fim, Contrera destacou um ponto muito forte que foi visto como tendência, que é o de “ser local”. “Sejam locais e estejam próximos das comunidades. Em casos de marcas nacionais, que têm formatos pequenos e não conseguem ser locais, tentem trazer para essas lojas um pouco de acolhimento ao local, seja com produtos da região ou com mão de obra local”, completa.
Cenário norte-americano
André Sacconato destacou que o maior problema da economia norte-americana é a inflação e que, a partir de 2023, o Banco Central norte-americano (FED) precisará adotar medidas mais severas para combater a alta de preços. Segundo ele, esse momento passa por escolhas que o FED tomou ao longo da pandemia para amenizar os impactos causados pelo vírus.
Outro problema apontado na economia norte-americana é a dificuldade de diversas empresas de preencherem vagas de trabalho, já que o taxa desemprego está na casa de 3,9%. “O mercado de trabalho nos Estados Unidos está altamente pressionado e estava assim desde o meio do ano passado”, comenta.
Saconnato cita também a quantidade de dinheiro que está rodando na economia americana como um dos fatores para a alta inflação. “No momento atual, são quase 20 trilhões de dólares rodando na economia. Há 3 anos esse número era de 4 trilhões”, explica o analista.
Reflexos no Brasil
Ao analisar e refletir sobre os impactos do cenário dos EUA, aqui no Brasil, Marcelo Allain definiu que o momento brasileiro possui similaridades e diferenças em relação ao norte-americano. Ambos os países vivem um momento de aumento da inflação, embora no Brasil o Banco Central já tenha começado a taxa básica de juros, que chegou a 10,75% na última reunião do Copom, nesta quarta-feira, 2.
Uma das principais diferenças entre as duas economias é a realidade do mercado de trabalho brasileiro, com o índice de desocupados em torno de 11,5% em novembro do ano passado. Enquanto nos EUA faltam profissionais para trabalhar e os salários aumentam, em solo brasileiro ocorre o contrário.
“Aqui no Brasil, nós estamos tendo uma drástica redução do poder aquisitivo da população. A população perdeu renda, tanto quem deixou de trabalhar e foi recontratado com um salário menor, quanto em função da inflação”, comenta.
Allain também destacou que as vendas de produtos no varejo, após atingir um pico durante a pandemia, deram uma decrescida, mas seguem maiores do que os níveis pré-pandemia e deverão seguir crescendo. “Infelizmente, não é uma trajetória de 5% ao ano, como nos EUA. É mais modesto, mas é uma trajetória que continua”, complementa o economista.
Por fim, Allain fez um resumo dos cenários distintos entre os dois países e reforçou que a situação do mercado de trabalho brasileiro, a redução do poder aquisitivo e o aumento do endividamento limitam as perspectivas de grandes ganhos no consumo em 2022. “Devemos ter um consumo ainda modesto, pensando de maneira modesta”, finaliza.
Imagem: Marcelo Audinino