A gestora Fama Re.capital está lançando o primeiro fundo que irá comprar ações em Bolsa de grandes emissores de carbono para tentar influenciar ativamente na gestão das empresas e engajá-las rumo a metas de melhoria climática. Entre os setores nos quais o fundo Latam Climate Turnaround irá investir estão petróleo, mineração e siderurgia, produtores de cimento, geradores de energia e commodities agrícolas. De acordo com Fabio Alperowitch, sócio da Fama, é “90% de certeza que a primeira investida será do agronegócio”.
Ao contrário de outros países nos quais o chamado stewardship (comportamento ético e responsável) climático está sendo implantado no mercado financeiro, o modelo desenvolvido pela Fama buscará uma espécie de “parceria” com as empresas investidas. “No Brasil, as empresas de capital aberto são controladas por famílias ou grupos econômicos e as estratégias usadas lá fora, como buscar mudanças via participações em assembleias ou conselho de administração não funcionam”, diz ele. “Não adianta guerrear com a empresa: teremos uma abordagem amigável e persuasiva, no sentido de mostrar que mudar é bom também para elas.”
Para isso, a presença do fundo nas empresas contará com um time multidisciplinar formado por ativistas, financistas, advogados e cientistas do clima. Eles tentarão mostrar à gestão, com base em dados e evidências científicas, a criação de valor para a empresa, ligada tanto à linha do lucro no balanço quanto à cotação dos papéis na Bolsa.
Isso envolve mitigação de riscos financeiros causados por impactos ambientais das empresas, perspectiva de aumento do faturamento e redução de despesas futuras, como litígios e de uso de matérias primas, bem como do custo de capital. “Iremos articular informações de modo a convencer o CFO diretor financeiro de que a mudança vai ter impacto positivo no caixa da empresa”, afirma Caroline Prolo, da Fama. “Levaremos soluções, suporte técnico e estratégico, que poderá se inserir na estrutura de governança da companhia.”
Para ela, será difícil encontrar resistência por parte das companhias, uma vez que a percepção das mudanças climáticas tem se tornado explícita e dolorosa para todos, seja em eventos como a tempestade que deixou milhares de paulistas sem luz na semana passada ou a seca que resultou em pessoas ilhadas às margens dos rios amazônicos.
Além de terem o capital aberto, as empresas a serem investidas precisam divulgar suas emissões nos escopos 1 e 2, emitirem acima de uma tonelada de gás carbônico por ano, terem perspectiva de crescimento, governança climática transparente e estratégia climática, entre outras exigências. A ideia é investir em companhias que tenham desempenho saudável e fazer o turnaround – ou transformação – climático.
Apesar de a abordagem almejada ser a de engajamento com a empresa, serão estudadas medidas para a cobrança do dever fiduciário com a boa gestão dos riscos climáticos caso a empresa não tenha aderência às diretrizes do fundo. Entre as medidas, está a divulgação de cartas públicas, sendo que iniciativas administrativas e judiciais também poderão ser executadas, mas como últimos recursos.
Registrado na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), o fundo de ações está aberto ao investidor qualificado para captação no Brasil até 30 de novembro. A distribuição não está sendo feita em plataformas de investimento. “Neste momento, queremos ter contato com o investidor final”, diz Alperowitch. “. Futuramente, talvez, poderemos oferecer em plataformas.”
Não foi estabelecida uma meta de captação, mas a perspectiva é que a adesão no exterior, que deve ser iniciada no primeiro semestre do próximo ano, seja mais relevante que a doméstica. A taxa de administração é de 2% ao ano, o prazo de pagamento de resgates, de 182 dias, e o índice de referência para rentabilidade do fundo é IPCA+ 6% ao ano.
Além do desempenho financeiro das ações das investidas e da taxa de administração, a gestora do fundo cobra taxa de performance, como o fazem a maioria dos gestores de fundos de ações. Mas esse custo ao cotista está atrelado a dois retornos: um é o financeiro acima do indicador de referência. O outro é a redução das emissões das companhias investidas e à redução da “temperatura média” do portfólio, medida pela metodologia de classificação do CDP-WWF. Ao final de um ano após o investimento, essa temperatura terá de ser menor do que a inicialmente definida. Caso não seja, a taxa de performance paga à gestora será “severamente reduzida”.
Assim, o fundo não cobrará taxa de performance, caso a empresa não atinja o benchmark financeiro. Caso consiga alcançar esse objetivo, mas não atinja o desempenho de impacto climático estabelecido, a taxa será de 10%. Se atingir ambas, o porcentual será de 25%.
Com informações de Estadão Conteúdo.
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