Antes da pandemia o quadro do setor de turismo já era difícil. Agora é crítico e depois vai piorar. E o mérito é só nosso.
Esse setor que na maioria dos países do mundo é gerador de recursos econômicos e sociais, promotor de desenvolvimento e pode contribuir para uma percepção positiva sobre os produtos, marcas e serviços oferecidos, alavancando exportações, no Brasil é uma atividade pária.
Um segmento econômico repleto de promessas, boas intenções e sem nenhum projeto pensado e realizado com visão de longo prazo. E não faltaram iniciativas e programas que sempre foram menores em seus resultados, como Copa do Mundo e Olimpíadas.
E se já enfrentava seu destino inglório antes da pandemia, durante e depois ainda vai sofrer com a deterioração da imagem global do país comprometida pelos desacertos nas questões de saúde, prevenção sanitária, sustentabilidade, preservação ambiental e ecológica.
Apesar de ter políticas preservacionistas avançadas, apesar da exuberância da natureza, apesar do trabalho sério feito por muitas entidades ligadas à sustentabilidade, a imagem externa do país nesses temas, deteriorou nos últimos anos, por sua desatenção com a comunicação global, problema, aliás, que não é privilégio só do turismo.
O resultado prático é que o que já era ruim vai ficar pior.
No período de 2010 a 2018, o fluxo turístico global cresceu de 952 milhões para 1.407 milhões, com uma expansão de 48%. Nesse período no Brasil, cresceu de 5,2 para 6,6 milhões, uma variação de apenas 27%. E em 2019 esse fluxo caiu para 6,4 milhões.
No ano passado foram apenas 2,8 milhões de turistas de fora da América do Sul.
Para efeito de comparação vale lembrar que no período de 2010 a 2018, enquanto o número de visitantes internacionais para o Brasil cresceu 27%, no México evoluiu 77%, no Irã 151% e no Vietnã 210%. Ou seja, viajou-se muito mais e nós ficamos à margem desse aumento de fluxo.
Enquanto em 2019 recebemos 6,4 milhões de turistas, 56% dos quais de países nossos vizinhos da América do Sul, a Turquia recebeu 46 milhões, o México 41 e a Tailândia 38 milhões.
O resultado de tudo isso é que, no período de 2010 a 2018, as receitas globais do turismo no mundo cresceram 48% e no Brasil evoluíram de US$ 5,3 para US$ 5,9 bilhões, uma evolução pífia de 11%. E como fazem falta as receitas que poderiam vir desse setor!
E temos que ser realistas, nada indica que possa melhorar no futuro próximo. Ao contrário.
Passado o período mais crítico da pandemia, haverá gradativa retomada do fluxo turístico global e as estimativas atuais são que, a partir de meados de 2021, com o acesso e disseminação das vacinas preventivas ao Covid-19, o mundo possa se aproximar novamente dos patamares vividos em 2019. Mas não para o fluxo de turismo receptivo para o Brasil.
Uma série de fatores irá conspirar para essa redução do fluxo de turistas internacionais, pois, além da deterioração de nossa imagem pelas questões de saúde e sustentabilidade já citadas, temos uma mudança significativa e estrutural envolvendo os novos conceitos de viagens de negócios e eventos pelo uso das alternativas digitais e as questões burocráticas envolvendo visto. Sem falar na estrutura da oferta local para atrair visitantes mais maduros e sofisticados em seus gostos, aqueles que mais gastam e mais receitas deixam para o país.
A principal causa para essa alienação e miopia envolvendo o potencial do turismo está na forma como o tema é tratado e administrado. A começar pelo fato do setor não estar ligado à economia, mas sendo administrado por uma ótica política, quando não partidária. Ao longo de tempo Embratur, Ministério do Turismo e demais órgãos envolvidos nunca chegaram a um projeto estratégico e consistente de longo prazo que estimulasse, ao mesmo tempo e de forma coordenada, os vetores de oferta de infraestrutura interna com ações para aumento da demanda externa. E que tivesse estrategicamente alguma integração com nossos vizinhos da América do Sul, pelas questões logísticas envolvidas.
E não faltaram verbas e recursos. E o que foi gasto e desperdiçado com Copa do Mundo, é o melhor exemplo.
Definitivamente o turismo é um dos setores que mais vinha sofrendo pelos problemas estruturais e gerenciais anteriores à pandemia, um dos que mais foi afetado pela redução da demanda durante esta crise e pela carência de apoio em recursos e atenção e, lamentavelmente, um dos que mais irá demorar em sua recuperação, agravada pelos nossos consistentes equívocos de postura, gestão e comunicação.
Tudo isso apesar de o Brasil ser absolutamente abençoado por sua exuberante natureza, belezas e atrações envolvendo cultura, música, gastronomia, arquitetura e um povo único em sua atitude hospitaleira e fraterna.
Como quase tudo que temos discutido, é um problema nosso para o qual falta outra forma de pensar e agir.
* Imagem reprodução