Os dados do desempenho do varejo e da economia norte-americana sinalizam um novo ciclo de expansão global que poderá impactar positivamente o Brasil nos próximos anos. Mas poderia ser muito melhor não fossem os desacertos na condução da economia brasileira.
O PIB nos Estados Unidos deverá apresentar em 2013 um crescimento em torno de 2%. A sinalização para o próximo ano é que possa chegar a 3%, beneficiado pela melhoria do nível de emprego, que está no patamar de 7% – no auge da crise chegou a 10,5% – e associado à recuperação do mercado imobiliário e do consumo de forma geral.
Esse será o cenário que marcará as discussões que ocorrerão durante a próxima NRF em Nova York na segunda semana de Janeiro, provavelmente o mais positivo desde que estourou a crise financeira e imobiliária em 2007.
Será interessante verificar como a estratégia vigente nesse período anterior do “back to basics”, ou seja, foco no essencial e na melhoria da produtividade será substituída por outras, com maior atenção para o desenvolvimento de novas alternativas de expansão em formatos, canais, negócios, produtos e serviços que possam se beneficiar desse novo ciclo de expansão no mercado interno e também no mercado internacional, em especial na Europa.
De fato o mercado europeu que sempre teve um papel relevante no crescimento da economia global também parece ter saído de seu período de profunda letargia, resultado da crise global, e dá mostras de leve recuperação, que se iniciou em 2013 e deverá prosseguir nos próximos anos, depois de um período de forte depuração econômica que trouxe uma nova realidade balizada por um comportamento ainda mais cauteloso dos consumidores.
No varejo norte-americano tudo sinaliza um crescimento no ano em torno de 4%, o melhor dos últimos períodos, sendo que até outubro, comparativamente com o mesmo período no ano passado, havia crescido 4,2%.
Um bom sinalizador do comportamento do varejo nos Estados Unidos neste final de ano sempre é o resultado do Black Friday que neste ano, para uma expectativa de crescimento de 3% em relação ao ano passado, apresentou expansão de apenas 1,9% segundo os dados da IBM Digital Analytics Benchmark ou 1,8% pelos dados da Thomson Reuters, ou seja, muito próximos entre si.
Interessante notar que o Cyber Monday, que se segue ao Black Friday nos EUA, neste ano teve expansão de 20,6% nas vendas digitais, que representam aproximadamente 6% do total de vendas no varejo norte-americano, mostrando uma clara tendência de aumento da participação desse segmento no conjunto dos negócios do varejo.
Enquanto isso, no Brasil o país avança trôpego com as pernas mancas como prefere o Ministro da Fazenda. Enquanto o setor privado luta para se manter competitivo e expansionista, os gestores públicos, em especial os do âmbito federal mantém sua consistente atitude de criação de problemas, dificuldades, incertezas e onerando tudo que possa ser feito.
Apesar desses problemas, que equivalem a correr uma maratona com uma mochila de pedras às costas, o consumo e o varejo no Brasil continuam sua expansão positiva, contribuindo na medida do possível para a evolução do débil PIB imposto pelos equívocos que têm sido cometidos.
A perspectiva para o crescimento acumulado do varejo brasileiro em 2013 está em torno de 4%, estando acumulado até outubro em 4,3%, beneficiado pela expansão da massa salarial, porém em patamar inferior ao ano passado, pelo baixo nível de desemprego e pela expansão do crédito ao consumo, ainda que com taxas mais altas.
Interessante notar que no caso da campanha do Black Friday no Brasil, estruturalmente diferente do mercado norte-americano, pois envolveu lojas físicas e digitais ao mesmo tempo, o crescimento das vendas em 2013 foi quase que o dobro do verificado no ano anterior, tendo atingido R$ 770 milhões.
Os próximos meses serão beneficiados pela redução do nível de inadimplência, que vem caindo desde o começo do ano e por uma pequena melhoria do nível de confiança do consumidor que se manteve baixo durante todo o primeiro semestre.
Nesse cenário a perspectiva para 2014 será de um crescimento do varejo em patamar similar ao de 2013 contando a seu favor com o efeito relativo da Copa do Mundo e do ano eleitoral, mantidas as tendências de leve expansão da massa salarial, do crédito ao consumo, uma inadimplência controlada e a confiança do consumidor nos patamares atuais ou com leve melhoria, que poderá oscilar ao sabor dos resultados da própria Copa para o país.
A triste constatação é que o mundo, liderado pelos Estados Unidos, tenderá a ter um período de maior recuperação econômica nos próximos anos, que poderá beneficiar indiretamente o país, mas que, de outro lado, irá redirecionar investimentos internacionais, reduzindo a atratividade do Brasil que foi beneficiado nesse aspecto nos últimos anos e não soube capitalizar a conjugação virtuosa de fatores positivos que incluiu desde o bônus demográfico até os grandes eventos esportivos mundiais.
A janela global que se abriu para o Brasil nesse período de 10 anos está se fechando e o sentimento que fica é que, por nossas próprias atitudes, ficamos mais a ver a banda passar do que assumir o papel estratégico que a História havia nos proposto.
Marcos Gouvêa de Souza (mgsouza@gsmd.com.br) diretor-geral da GS&MD – Gouvêa de Souza.