A Zinklar fez uma pesquisa encomendada por nós, do Instituto Mulheres do Varejo, que mostra que de 200 pesquisadas atuantes no varejo e indústria, 46% afirmam ter sofrido assédio no trabalho. Mas não perceberam nenhuma ação concreta quando denunciaram o agressor. E 23% disseram ter sido desligadas depois do ocorrido.
Entre as entrevistadas, 40% disseram que a empresa onde trabalham possui um canal de denúncia, enquanto 45% disseram que não. Quando perguntadas se sentem confortáveis e confiam em realizar alguma denúncia, 62% acreditam que as empresas tomarão as medidas necessárias, mantendo sigilo sobre meu nome. Já 24% acreditam que a denúncia não dará em nada.
Um assunto bem delicado que tem vindo à tona depois da Lei 14.457/2022 e da Portaria MTP 4.219/22 instituirem que as empresas devem ter treinamentos e palestras periódicas feitas pela Cipa para prevenção ao assédio sexual e outros tipos de violência.
Conversando com um professor de uma renomada faculdade em São Paulo, ele me alertou que várias alunas contaram casos de clientes assediando as colaboradoras tanto moralmente, quanto sexualmente. Segundo ele, os casos não estavam sendo tratados pelas empresas de maneira apropriada e, muitas vezes, sem apoio algum. Ainda estão com o mindset “O cliente tem sempre razão”.
É por isso que gostaria de sugerir que as empresas comecem a discutir o que inegociável, pensando numa transformação e reeducação da população. Assim, começamos a praticar o ESG de verdade.
Tenho uma amiga negra que foi retirada da operação de uma rede hoteleira por uns dias porque um estrangeiro famoso estava a assediando. Ela não concordou com a atitude e, dias depois, foi demitida.
Até quando o agressor vai ser privilegiado? Só educamos a população quando não abafamos os casos de crimes (racismo, assédio e importunação sexual são crimes) ou violência cometidos, sejam cometidos por um presidente, diretor ou um cliente.
Para quem acha que está deixando de lucrar, pode ter certeza que está totalmente enganado. O mundo tem mudado, sim. Muitas mulheres hoje têm redes de apoio e se posicionam. Sempre oriento as mais jovens quando a pergunta é “Sofri assédio e o RH não tomou nenhuma atitude, mas preciso pagar as minhas contas. O que eu faço?”
Peça demissão, pois é esse o tipo de empresa que não queremos trabalhar. “Nossa vida é inegociável, como sempre diz Vanessa Sandrini”, fundadora do Mulheres do Varejo.
Hoje é a sua reputação que está em jogo. Com tantas informações na internet, o próximo passo das pessoas é escolher com quem querem estar.
Temos casos interessantes de outro resort que recebeu um casal que fez um único pedido em pleno século 21: “não quero ser atendidos por negros”. Como a empresa já tinha suas regras inegociáveis, a recepcionista chamou o gerente que disse ao casal: “Infelizmente, vocês não poderão se hospedar aqui, pois racismo é crime”. Isso é reeducar as pessoas, promover transformações, engajar colaboradores e manter sua reputação.
Ultimamente, ouço muitas pessoas dizerem que o mundo está chato, pois não falar mais nada. Na minha opinião, nunca esteve melhor, pois estamos fazendo com que nosso cérebro reconstrua novas trilhas e crie novas habilidades. Não é incrível isso acontecer num mundo em que acham que um ChatGPT vai dominar o planeta?
Como diz meu amigo Felipe Requião, de uma consultoria de diversidade que promove rodas de conversas com homens: “o chato é o mundo racista, machista, homofóbico”.
Por isso, comecem pelo básico: o que é inegociável dentro da sua empresa?
Sandra Takata é presidente do Instituto Mulheres do Varejo.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo.
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