A falta de peças, e também de mão de obra para a fabricação de aviões – problema que afeta Boeing, Airbus e Embraer há meses -, começa a ter efeitos negativos nos balanços financeiros das empresas e não deve ser uma questão resolvida antes de meados de 2023.
Nas últimas semanas, o presidente da companhia brasileira, Francisco Gomes Neto, e o da americana, Dave Calhoun, afirmaram que não veem uma solução rápida, mas que acreditam que conseguirão, ao poucos, aumentar suas produções em 2023 conforme os atrasos na entrega de suprimentos diminuírem. O presidente da Airbus, Guillaume Faury, também disse que o entrave deve durar ao menos até o fim do primeiro semestre.
A crise decorre das interrupções das cadeias de produção durante a pandemia e também do aquecimento do mercado de trabalho nos países avançados.
Nos Estados Unidos principalmente, após receberem auxílio financeiro quando as atividades foram interrompidas por causa da covid e depois de se acostumarem ao trabalho remoto, muitos trabalhadores não querem voltar aos padrões pré-pandemia. Isso reduziu a mão de obra disponível, elevou os salários no país e tem dificultado as contratações pelas empresas. No caso do setor aéreo, o problema atinge não só os fabricantes de aviões, mas também seus fornecedores.
“As receitas continuarão a ser significativamente impactadas até que a cadeia de suprimentos global se estabilize, a escassez de mão de obra diminua, as entregas aumentem e o setor de aviação comercial se recupere dos impactos persistentes da pandemia”, diz o relatório de divulgação de resultados do terceiro trimestre da Boeing.
O problema da falta de peças e de trabalhadores foi a questão central das teleconferências sobre os resultados do terceiro trimestre que as três empresas realizaram com investidores recentemente. Executivos de companhias aéreas já haviam destacado que o problema se estende por todo o setor e que acrescentariam voos extras a suas malhas se recebessem aeronaves cuja entrega está atrasada.
Para o presidente da Airbus, o principal empecilho é a escassez de trabalhadores. O da Boeing destacou os atrasos na entrega de motores, e o da Embraer, além da falta de motores, a de equipamentos para as cabines.
Na semana passada, executivos da Embraer afirmaram que devem conseguir entregar até o fim do ano o total de aeronaves previstas – eles admitem, no entanto, que a estimativa era conservadora. A projeção é de 60 a 70 aviões comerciais e de 100 a 110 jatos executivos. O resultado, acrescentam, deve ficar mais próximo ao número mínimo prometido. “Vai ser uma luta (para conseguir entregar as aeronaves) até o último dia do ano”, afirmou o vice-presidente de relações com investidores da empresa, Antonio Garcia. Ainda segundo ele, a média no atraso dos fornecedores é de 40 a 50 dias.
Semanas antes, a Boeing havia afirmado, em seu relatório trimestral, que “o nível de lucratividade do programa 777X (família de aviões com capacidade entre 384 e 426 passageiros) está sujeita a vários fatores. Entre eles a incerteza contínua do mercado, os impactos persistentes da covid-19 em nosso sistema de produção, na cadeia de suprimentos e em nossos cliente.”
Em relação ao programa da aeronave militar KC-46A, a companhia disse que as perdas relacionadas ao projeto aumentaram principalmente devidos aos “custos mais altos de produção e de fornecimento de peças que decorrem, em parte, da escassez de mão de obra e das interrupções nas cadeias de suprimentos”.
Guerra na Ucrânia também prejudica
Para tentar reduzir os prejuízos decorrentes dessa crise, as fabricantes de jatos têm colocado seu pessoal dentro das empresas fornecedoras para estudar como amenizar a situação e alinhar seu ritmo de produção ao de entrega de peças. Segundo o presidente da Boeing, a companhia tem desacelerado as linhas de produção quando necessário e já contratou cerca de dez mil funcionários neste ano. “Estamos investindo em treinamento para acelerar a curva de aprendizado (dos profissionais) e melhorar nossa produtividade”, destacou Calhoun a investidores.
Além das questões relacionadas à covid, a guerra na Ucrânia também ameaça a cadeia de suprimentos. Parte do titânio usado pelas companhias é proveniente da Rússia e as sanções impostas ao país podem prejudicar o fornecimento da matéria-prima. “A cadeia de abastecimento permanece frágil devido ao impacto da covid, à guerra na Ucrânia, aos problemas de abastecimento de energia e às restrições do mercado de trabalho”, disse, no fim de outubro, em nota o presidente da Airbus. No relatório de resultados do terceiro trimestre, a Boeing destacou ter materiais e peças provenientes da Rússia em volume suficiente para evitar disrupções no curto prazo, mas que impactos futuros nas cadeias de suprimentos “são possíveis”.
Em nota, a companhia americana afirmou estar trabalhando em “estreita colaboração com os fornecedores para equilibrar a oferta e a demanda e mitigar riscos que possam afetar a estabilidade e a eficiência em nossa cadeia de fornecimento”. A Airbus não quis comentar o assunto, e a Embraer não respondeu até a publicação deste texto.
Com informações de Estadão Conteúdo (Luciana Dyniewicz)
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