Nos Estados Unidos a Macy’s acaba de anunciar um novo CEO que terá como missão repensar o negócio como um todo, num cenário cada vez mais desafiador para o formato que, consistentemente, perde participação de mercado ano após ano.
De um passado glorioso, considerados templos de consumo (onde tudo que era novo era lançado lá), as lojas de departamentos têm enfrentado, especialmente nos Estados Unidos, a perda de participação como formato de loja de varejo.
As razões são diversas, mas a realidade uma só.
É um formato de loja que tem perdido capacidade de entender e atender as novas demandas do mercado e seu modelo de negócio, de oferta de grande variedade em muitos departamentos com preços em constante promoção não se mostra competitivo frentes às novas alternativas que surgiram.
Marcas icônicas como a própria Macy’s e mais Bloomingdales, Dillard’s, Sacks, May, JC Penney, Sears, Neiman Marcus, Lord & Taylor, Carson’s, Kohl’s, Montgomerry Ward e muitas outras, fundiram, desapareceram ou lutam para sobreviver no processo irreversível de transformação e modernização de formatos que ainda sofre, adicionalmente, a concorrência recente do canal digital.
Talvez uma exceção seja a Nordstrom, com sua proposta diferenciada de sortimento mais limitado, ambiciosa atuação no digital e um padrão de serviços que se transformou em benchmarking global, que tem conseguido operar bons resultados, muito acima das medias do setor.
Na Europa, a realidade é um pouco diferente, pois as questões ligadas à mobilidade urbana criaram perspectivas diversas, fazendo com que o espaço de redes como El Corte Inglés na Espanha, Rinascente na Itália, Printemps, Galeries Lafaiette, Le Bon Marche na França, Kaufhof, Karstadt e KaDeVe na Alemanha, Selfridges, Harrods, John Lewis e Debenhams na Inglaterra seja menor, em termos de participação de mercado, mas sem mostrar o mesmo drama vivido nos Estados Unidos.
Interessante destacar que na busca por sua renovação, alguns movimentos foram especialmente interessantes como o da centenária rede inglesa John Lewis, que se reinventou a partir de sua atuação com e-commerce, sendo hoje um benchmarking global em omnicanal por sua estratégia nessa integração.
Da mesma forma, como o movimento de Selfridges, Galleries Lafaiette, KaDeVe e Harrods com a revitalização apoiada na valorização da alimentação, com espaços, conceitos e práticas envolvendo alimentação fora do lar e gourmet.
Na Ásia, esse processo vive momento muito diferente, com algumas das principais cadeias do Japão, China, Cingapura e Coréia do Sul com forte presença e atuação de mercado, menos impactadas pela perda de vitalidade do formato. Porém, todas elas com participação relevante nas categorias de alimentação.
No Oriente Médio, especialmente Dubai, Quatar e Abu Dhabi, o apelo das marcas globais do setor de lojas de departamentos, operadas por meio de licenças, franquias ou sociedade na região, têm forte apelo e presença para consumidores que tiveram enorme crescimento em sua capacidade de consume, especialmente no período de petróleo com preços mais altos.
Na América Latina, com exceção do Brasil, o formato ainda tem forte apelo em seu modelo mais tradicional, onde redes como Almacenes Paris ou Falabella, no Chile, assim como Sanborns, Palacio de Hierro e Liverpool, no México, têm forte presença e participação de mercado, principalmente graças à força de seus cartões de crédito, que em países como o próprio Chile e também Peru, Colômbia, Equador e o México asseguram um vínculo muito forte com os consumidores, criando forte vantagem competitiva.
Porém, em todos esses casos, os grupos controladores dessas redes operam outros formatos varejistas especializados, da mesma forma como faz o El Corte Ingles, na Espanha; o Liverpool, no México e o Galeries Lafaiette, na França, neste caso, com forte participação do Grupo Casino em seu controle.
Mas, seguramente um dos mais relevantes operadores de loja de departamentos no mundo é a Mexicana Palacio del Hierro, especialmente em sua loja no bairro de Polanco, na Cidade do México, mas também com suas lojas destacando-se por sua oferta de marcas e conceitos, dentro de uma arquitetura contemporânea e um modelo de negócio que privilegia as mais conhecidas marcas globais, com espaços dedicados a cada uma delas que a transforma mais num shopping center do que numa loja de departamentos convencional. Sem dúvida benchmarking no conceito em todo o mundo.
No caso do Brasil, as lojas de departamentos tradicionais desapareceram por conta de uma combinação perversa de “fadiga de material”, ou seja esgotamento do modelo, dificuldade de diferenciação de oferta, taxas de juros e custo de capital elevado que inviabilizavam estoques elevados e com menor giro, característicos desse formato, além de equívocos sérios de gestão e estratégia.
Com isso, marcas como Mesbla, Sears, Sandiz e Mappin, anteriormente também ícones do varejo local, saíram do mapa e hoje são apenas lembranças de tempos mais glamurosos e menos competitivos.
Interessante observar que os formatos sucessores das antigas lojas tradicionais de departamentos no Brasil foram as grandes lojas especializadas em vestuário e calçados, como Renner, Riachuelo, Marisa, Pernambucanas e C&A, que ocuparam o mesmo espaço mental na cabeça dos consumidores e muitas vezes o mesmo espaço físico nas ruas e shoppings, dessas marcas.
Em diferentes combinações entre as empresas, seu modelo vencedor foi uma combinação virtuosa de menor espaço físico, variedade ampla de produtos, porém controlada para giro mais rápido, preços competitivos, muita eficiência operacional, preponderância de marcas próprias, forte apelo de moda acessível e relevante atuação no crédito, incluindo cartões próprios, para criação de vantagem competitiva.
Com essa combinação, mais focados e competitivos, evoluíram principalmente no período de 2003 até o presente, aproveitando o cenário de aumento de consumo, expandindo fortemente, especialmente em lojas físicas e aumentando sua participação de mercado.
Nesse período, C&A, Marisa e Renner fizeram algum movimento, ainda tímido, no cenário digital. A Renner avançou para incorporar novas marcas e formatos, como Camicado. A Riachuelo cresceu muito em sua proposta de integração vertical em produtos e serviços financeiros, porém a Marisa e as Pernambucanas tiveram dificuldades operacionais e de gestão, em momentos e dimensões distintas.
Interessante notar que, gradativamente, essas redes têm incorporado novas categorias, ampliando sua oferta, como perfumaria e cosméticos (na Renner) e telefonia celular (Riachuelo), e, adicionalmente, em quase todas elas, serviços financeiros.
Não está fora de cogitação, no futuro, o dia em que veremos algumas dessas empresas também entrando no mercado de alimentação gourmet, pelo apelo e convergência com seu posicionamento, como aconteceu com alguns operadores internacionais, o que as aproximaria um pouco mais dos modelos mais tradicionais de lojas de departamentos, porém adequados à realidade local.