O mundo mudou. Digitalizado, interconectado, veloz, assustador e ainda assim magnífico, nosso planeta pouco se parece com o lugar onde nossos avós viveram e prosperaram. Vivemos em um mundo em transição, onde a única certeza é de que um dia jamais será igual ao outro. Nós, que nos acostumamos a desenvolver mecanismos de controle para administrar nossos negócios, somos agora obrigados a conviver com mudanças constantes, provocadas pela tecnologia, pelos novos perfis e comportamentos dos consumidores e pelas novas dinâmicas de competição do mercado. Nossas velhas estratégias não funcionam mais e o sucesso no passado não é garantia de sobrevivência no futuro.
Você gosta de ver as coisas funcionando sempre à sua maneira? Detesta imprevistos e mudanças de rumo? Tenta sempre manter todas as variáveis que podem influenciar sua carreira e seu negócio sob controle? Bem, imagino que provavelmente esteja encontrando alguma dificuldade para se ambientar nestes tempos complexos que vivemos hoje. Quer uma dica? A ordem agora é construir modelos flexíveis e capazes de evoluir continuamente, adaptando-se à inconstância permanente deste admirável mundo novo, que se transforma à medida que nos relacionamos com ele.
Outro dia resolvi reler a história dos sábios cegos que queriam conhecer um elefante. Você conhece? É mais ou menos assim. Seis homens cegos do Hindustão, que gostavam muito de aprender coisas novas, foram apresentados pela primeira vez a um imenso paquiderme. O primeiro sábio se aproximou do elefante e logo se chocou contra o lado do animal. Imediatamente passou a acreditar que ele se parecia com um muro. O segundo pegou na presa e saiu gritando que o elefante era como uma lança. O terceiro encostou na tromba e, assustado, achou que o elefante era semelhante a uma cobra. O quarto tocou o joelho enrugado do animal e imaginou que ele era como uma árvore. O quinto apalpou a sua enorme orelha e visualizou o elefante como um leque. E o último deles, ao esbarrar na cauda, se convenceu de que o elefante, em realidade, era parecido mesmo com uma corda. Todos estavam parcialmente certos e, ao mesmo tempo, completamente errados. Mesmo assim, munidos de suas certezas, esses homens passaram a discutir calorosamente sobre um elefante que nunca tinham visto.
Na minha vida pessoal e profissional já vi e até mesmo participei de muitos debates como o descrito na história de John Godfrey Saxe. Marketing versus Vendas, Físico versus Digital, Shoppings versus Lojistas. Estes são apenas alguns exemplos de embates inúteis nos quais desperdicei tempo e energia, sem perceber a tolice que cometia. Ainda hoje, vejo com algum desânimo pessoas e empresas se engajarem em discursos semelhantes aos dos cegos, reproduzindo um modelo de mundo arcaico e ultrapassado.
Sabe por que isso acontece?
Fomos informados sobre o funcionamento do mundo através da imagem mecanicista, enfatizada no século 17 por gênios como Isaac Newton e René Descartes. Crescemos acreditando que quanto mais sabemos sobre o funcionamento de cada parte, mais vamos aprender sobre o todo. Que as coisas devem ser separadas e dissecadas, literalmente ou figurativamente.
E assim fizemos, tanto com as funções nas empresas quanto com as disciplinas acadêmicas, as áreas de especialização e as partes do corpo humano. Por isso, não entendemos a realidade por completo e nos sentimos perdidos quando vemos as fronteiras se dissolvendo na frente dos nossos olhos.
Você lembra em que ano aconteceu a queda do Muro de Berlin? Faz tempo, foi no finzinho de 1989. Mais do que um momento histórico, aquele evento é uma metáfora das modificações que assolam a sociedade. De lá para cá vários muros caíram de velhos ou foram derrubados pela força dos novos tempos.
Muros, fronteiras e linhas divisórias estão se dissolvendo todos os dias, bem diante dos nossos olhos. Conclusão? Está cada dia mais difícil separar as coisas. Vida profissional e pessoal, papéis masculinos e femininos, direita e esquerda, entretenimento e consumo. Entre o preto e o branco há pelo menos 50 tons de cinza.
Margaret Wheatley, em seu importante livro “Liderança e a Nova Ciência”, defende a tese de que a materialista lógica newtoniana, predominante no século 17, não consegue mais explicar o funcionamento das coisas. A ideia de que tudo deve funcionar com a perfeição de uma máquina conduziu naturalmente as pessoas a acreditarem em departamentos que funcionam de maneira isolada, especialistas que desenvolvem conhecimentos extremamente específicos e em empresas com os olhos fixados no próprio umbigo.
Segundo Margaret, precisamos nos libertar destes hábitos, adotando conceitos mais adequados aos tempos que vivemos. Afinal, o ambiente externo mudou. Aliás, continua mudando todos os dias. Para se adaptarem, pessoas e empresas precisam de mais conhecimento e agilidade, sensibilidade para valorizar o intangível e uma visão de mundo abrangente, holística. Nesta sociedade em rede, intercomunicada e interdependente, mais importante do que a eficiência das partes será o relacionamento entre o todo. Isso inclui a relação entre empresas e seus clientes, fornecedores, colaboradores e até competidores.
Diante deste cenário, ferramentas e estratégias eficazes no passado parecem tão poderosas quanto um estilingue em um campo de batalha atual.
As mudanças estão apenas começando. Os modelos de empresas e negócios de antigamente vão morrer de velhice. Em seu lugar surgirão estruturas ao mesmo tempo independentes, interdependentes e intradependentes, como definiu Dee Hock, fundador da Visa, em seu livro de memórias, “O nascimento da era caórdica”.
Estamos todos no mesmo barco. Julgamos ser sábios, mas somos cegos. Ou nos ajudamos uns aos outros, ou nunca teremos uma ideia precisa da imagem do elefante. É tempo de nos livrarmos da dependência excessiva do “Eu” e apostarmos nas imensas possibilidades do “Todos Nós”. Vamos tentar?
Luiz Alberto Marinho é sócio-diretor da Gouvêa Malls.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo.
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