Para começar este assunto vale aqui um ajuste de nomenclatura. “Agência de publicidade” é um termo anacrônico que não se aplica mais ao centro dos negócios de uma empresa de comunicação. E que não deveria existir mais.
O termo “agência” vem do tempo em que a compra dos espaços publicitários disponíveis em veículos de comunicação eram geridos por um “broker” (um intermediário), no caso, um “agente” que analisava e recomendava os melhores espaços para divulgar as marcas dos seus clientes.
Aliás, “brokers” estão atualmente em desuso: corretor de imóveis (vide QuintoAndar, “desintermediando” o grosso do mercado imobiliário), corretor de seguros (Youse é mais uma tentativa, ainda a se provar), agente de turismo (sites como Decolar) e por aí vai.
Só que a desintermediação dos brokers para nas primeiras páginas desse livro chamado “Negócios”. Quanto mais complexa vai ficando a categoria ou o segmento de negócios, mais dependente de um intermediador competente a empresa fica. E esse é o caso das agências de publicidade.
Levante a mão qual de nós não quer visibilidade para seu negócio e suas marcas!? Agora levante a mão aquele que não precisa de recorrência nas vendas, fidelização de clientes ou de recomendação de produtos entre amigos. Ainda mais importante, levante a mão aquele que quer estar na lembrança dos usuários na hora deles criarem suas listas de compras.
Todas perguntas retóricas. Todas as empresas precisam de tudo isso, ainda mais nos dias de hoje, onde tudo é mídia, seja offline ou online. Um palito de sorvete pode ser mídia? Sim. A testa de algum maluco que queira “ser usado” como veículo pode ser mídia? E o patrocínio de um blog digital? Uso de influenciadores dando aval a um produto e a uma marca?
Pois é, meu amigo. A complexidade do marketing de hoje está intimamente relacionada às questões relacionais entre marca e usuário, ou seja, à comunicação.
As “agências” têm se especializado nessas relações, seja pelo conhecimento profundo das jornadas de compra de usuários de diferentes categorias, seja pelo expertise em selecionar os pontos de contato de maior retorno do investimento das empresas.
Agora, pergunte-se: como uma agência ganha dinheiro para “ajudar” anunciantes nessa complexa equação? Se a sua resposta (ainda) for “com a comissão na intermediação de compra de mídia”, esse artigo é realmente para você.
A nova definição das empresas de comunicação (ou como queira, das agências de publicidade).
Num hipotético dicionário de negócios, a melhor definição para o termo “agência de publicidade” deveria ser algo como:
“Agência de Publicidade” (s.f.):
Definição: Entidade especializada no profundo entendimento da Jornada de Consumo, ou Psicologia de Consumo, e especialmente no Funil de Conversão em Vendas de marcas, ou Behavioral Economics (ciência que estuda as tomadas de decisão das pessoas).
Encarregada em aplicar estratégias de relacionamento eficazes entre marcas e usuários para construção de relacionamentos fortes entre elas, utilizam das tecnologias mais contemporâneas que vão de plataformas de mídias sociais à Inteligência Artificial (IA). Isso sempre com o objetivo de manter um negócio competitivo e, primordialmente, presente na mente dos consumidores. Desafio este ampliado pelo bombardeio informativo da era digital.”
Pela primeira vez na história da publicidade, já há alguns anos, o lado direito do cérebro (responsável pela criatividade e subjetividade humana) trabalha de mãos dadas com o lado esquerdo (responsável pela leitura de dados, construção de analytics e dashboards, “coding” de aplicativos e novas tecnologias). Todos elementos fundamentais para a construção de marcas nos dias de hoje.
Um batalhão de profissionais diversos compõem hoje uma agência de publicidade. É um negócio que se sofisticou brutalmente e tem sido demandado de novos expertises cotidianamente. E ela está alinhada com o novo plano de atuação dos negócios neste século ao qual meu amigo Silvio Meira, PhD, renomado cientista brasileiro responsável pelo CESAR (Centro de Estudos Avançados de Recife), chama de “Realidade Figital”: Físico, Digital e Social.
Mas espera aí! Com atribuições tão sofisticadas e amplas, como fica a remuneração dessas “entidades”?
Um modelo de negócios que, acredite, ainda tem que se estabelecer.
Pagar por toda essa inteligência e profundidade através do comissionamento de compra de mídia, em que ao longo dos últimos 20 anos as comissões foram achatadas brutalmente, é não só uma espécie de desacato à sobrevivência do negócio por parte dos clientes, como um desafio impossível de enfrentar pelos empreendedores de agência.
Os modelos de relacionamento comercial entre os agentes deste mercado de comunicação (mais precisamente as agências e os veículos de comunicação) continuam prevendo escala em suas transações, ou seja “volume”. Mas não mais resultam em ganhos exponenciais de comissão como no passado, deixando a remuneração das empresas de comunicação em um nível praticamente falimentar, o que prejudica a especialização de seus profissionais nos assuntos cruciais para os negócios.
Vale a menção que aqui não estou me referindo às 20, 30 ou até 50 maiores empresas de comunicação do país do eixo Rio-SP, que de alguma forma mantêm esse modelo de relacionamento comercial com seus clientes que considero quase praticamente anacrônico e obsoleto para nova realidade de serviços prestados.
Estou apontando para a realidade de mais de 80% do mercado brasileiro de comunicação, ou seja, mais de 5.000 micro, pequenas e médias agências espalhadas pelo Brasil (e que atendem os anunciantes do mesmo tamanho e são responsáveis por grande parte do PIB brasileiro).
Além disso e, talvez, acima de tudo, está mais do que na hora de remunerar o trabalho subjetivo das agências. Explico melhor. As estratégias criativas com abordagens subjetivas das equipes de criação, precisam ser diretamente remuneradas e não indiretamente por comissões laterais na compra de espaço nos veículos.
Até porque, é através da abordagem criativa, rica em valores para penetrar no tecido social, que os usuários decidem comprar com maior ou menor interesse uma marca. Como diria a campanha de uma empresa financeira de cartão de crédito, isso é tão importante que é “priceless”.
“Agência” is the new “Consultoria”
Com a enorme gama de possibilidades e expertises dentro de uma empresa de comunicação está bem fácil confundi-las com o segmento de “Consultorias de Negócios” que já existem há anos. Será que as agências não seriam, portanto, “the new consultancies”?
O novo escopo de entregas de serviços aos clientes das agências de publicidade precisa ser visto com a estatura que merece. As agências somaram a herança do “glamour” do século 20, quase que poético e artístico da profissão, à “sofisticação e complexidade” deste século da informação. Tornaram-se ambientes sofisticados para alavancar negócios e marcas, sendo peça-chave para o sucesso no mundo atual, onde tudo é midiático, interconectado e dinâmico.
É essencial valorizar e compreender a complexidade e a relevância das empresas deste setor, assegurando uma remuneração condizente com sua entrega valiosa.
Proponho aqui uma reflexão sobre sua relação com esse “fornecedor” (diria, parceiro de negócios) na próxima vez que sua empresa precisar dos serviços de uma agência de publicidade: que tal realizar as perguntas propostas no início deste artigo sobre as suas necessidades de marca e colocar em perspectiva a importância desse tão importante player?
Já pensou em usar sua agência como “headcount”, ou melhor, como extensão do seu marketing? Você vai se impressionar com o capital intelectual instalado por lá. A diversidade de pessoas e a riqueza de experiências profissionais que são mobilizadas para atender a uma única demanda da sua empresa merece sua atenção.
É um universo de dedicação e expertise que trabalha com o objetivo de fazer seu negócio brilhar e se tornar sustentável num mundo tão competitivo.
Ulisses Zamboni é chairman e sócio-fundador da Agência Santa Clara.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo.
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