A abertura das lojas aos domingos, o acesso do consumidor de baixa renda ao mercado de consumo e a profissionalização do comércio são parte da realidade atual do varejo brasileiro. Essa evolução vem sendo acompanhada de perto, nas últimas décadas, pela Gouvêa Ecosystem, uma empresa focada em serviços e soluções para o setor de comércio, varejo e consumo fundada por Marcos Gouvêa de Souza, um dos maiores especialistas em varejo do País. A Gouvêa completa, em 2023, 35 anos.
A fundação da empresa, em 1988, se deu num contexto muito diferente, e não menos complexo, do que o atual. Na época, o setor era dominado por empresas familiares, a informalidade era ainda mais alta e o consumidor tinha acesso praticamente apenas a produtos fabricados e vendidos dentro do Brasil. A população de baixa renda estava fora do radar das empresas, embora desconfiassem de que ela guardava um imenso potencial de consumo.
Um dos marcos da contribuição da empresa para a compreensão do varejo brasileiro se deu no começo da década de 1990, quando a Gouvêa e a empresa de pesquisa InterScience fizeram uma pesquisa para mapear a dimensão do mercado de consumo do País.
“Havia uma discussão muito grande sobre qual era o real tamanho do mercado brasileiro, porque nos números não computavam as classes baixas. Então, a dúvida era: se as classes baixas ascendessem para poder consumir, o que mudaria no Brasil? Mostramos o que deveria ser feito e como incorporar esse segmento de baixa renda ao mercado”, lembra Marcos Gouvêa de Souza.
Intitulado “A Redescoberta do Real Mercado Brasileiro”, o estudo mostrou que não era mais possível ignorar a baixa renda, formada por pessoas que recebiam de 1 a 10 salários mínimos, porque o poder de compra desse grupo equivalia ao da classe média, que recebia entre 10 e 40 salários. O volume de dinheiro na base da pirâmide somava US$ 76,1 bilhões, ou 41,7% do total de consumo no Brasil.
A pesquisa apontou, ainda, que a população de baixa renda não tinha dinheiro para comprar os eletrodomésticos desejados pela classe média na época, como videocassetes, aparelhos de micro-ondas e aspiradores de pó. Mas estava ávida por adquirir aparelhos de TVs, refrigeradores, fogões e lavadoras de roupas.
Abertura comercial e delegações internacionais
Nos anos seguintes, a redução gradual das tarifas de importação, iniciada no governo do então presidente Fernando Collor de Mello, abriu o mercado para produtos estrangeiros e chacoalhou a indústria nacional, que se viu diante de novos competidores.
Foi nessa época que a Gouvêa começou a montar as primeiras delegações de empresários para conhecer a realidade dos Estados Unidos e dos países da Europa. As idas às feiras, as visitas técnicas a lojas e o compartilhamento de aprendizados em eventos, publicações, livros, artigos e palestras se tornaram marca da empresa – e foram replicadas mais tarde por outras consultorias.
Os grupos de executivos, em um número que inicialmente não preenchiam os dedos das mãos, foram crescendo ao longo dos anos. Hoje a
empresa, por meio do braço Gouvêa Experience, é responsável por ter levado centenas de brasileiros à NRF Retail’s Big Show, em Nova York (EUA), todo mês de janeiro, assim como para a NRA Show em Chicago e a RECon em Las Vegas (também nos EUA), a Euroshop em Dusseldorf (Alemanha) e o Single’s Day na China.
“A Gouvêa teve um papel muito importante na modernização e no reconhecimento do varejo brasileiro, tanto no Brasil, quanto fora dele. Foi uma das pioneiras em levar varejistas para participação em visitas e feiras no exterior, a fim de possibilitar um novo olhar sobre as operações de varejo brasileiras, comparadas às melhores e inspiradoras práticas internacionais. Mais do que isso, ajudou no entendimento do gap e dos cenários, auxiliando várias organizações a repensarem seus modelos”, relata Artur Grynbaum, CEO do Grupo Boticário e participante dos primeiros grupos.
A empresária Luiza Helena Trajano, presidente do Conselho de Administração do Magazine Luiza, também conheceu o evento americano por intermédio da Gouvêa. “Passei a frequentar a NRF para me atualizar e conhecer as tendências. A Gouvêa foi pioneira em pesquisar e interpretar o
universo do varejo, abraçando as principais causas desse setor.”
Outro movimento divisor de águas para o varejo brasileiro foi feito a partir de 1994, quando a então Gouvêa de Souza & MD coordenou outra pesquisa, essa em conjunto com o Programa de Administração de Varejo (Provar), da Universidade de São Paulo, sobre a abertura das lojas aos domingos. A questão causava polêmica entre os sindicatos, mas consumidores, dirigentes varejistas e até comerciários se mostraram favoráveis.
“Fora do Brasil, o domingo era um grande dia de vendas. A partir do momento em que a visão do consumidor foi trazida para a discussão, ficou difícil evitar a abertura. O domingo se transformou no segundo maior dia de vendas da semana e no maior dia de vendas por hora trabalhada”, relata Marcos.
Compartilhando conhecimento
O compartilhamento de conhecimento sempre foi parte, também, da missão geral da Gouvêa. Inicialmente com uma publicação semanal chamada “Retail Now”, a empresa passou a divulgar artigos escritos por especialistas e notícias do setor para o público em geral. O conteúdo passou, depois, a ser divulgado diariamente, culminando na criação da revista impressa Mercado&Consumo, em 2012, e no site de mesmo nome, que hoje é um dos 18 negócios do ecossistema e recebe, em média, 5 milhões de visualizações por mês, além de distribuir conteúdo em redes sociais e em diversos formatos, como podcasts e programas no YouTube.
Outra forma de compartilhar aprendizados foi com a criação, em 2015, do Latam Retail Show, o maior evento B2B de varejo e consumo da América Latina, que consolidou alguns eventos que a empresa já desenvolvia. “Sempre íamos para o exterior e participávamos de eventos, individualmente ou em grupo, e, na volta, compartilhávamos os aprendizados, para ampliar o número de pessoas que tinham acesso ao que acontecia lá fora. Mas percebemos que isso tinha uma certa limitação e optamos por criar um grande evento que pudesse trazer muito mais conteúdo para muito mais gente, com o grau elevado de curadoria, que posicionasse o Brasil diante de outros mercados.”
Presidente do Conselho de Administração do Grupo Guararapes, dono da Riachuelo, salienta o papel da Gouvêa Ecosystem e do próprio Marcos para o desenvolvimento do setor. “Marcos soube voltar as vistas de muitos varejistas e empreendedores brasileiros para a revolução que se avizinhava. Não existe economia de primeiro mundo sem um varejo de primeiro mundo. Ambos estariam ameaçados se não existisse essa instituição de excelência que exerceu, em muitos momentos, o papel de ‘cola’ e ‘farol’ no desabrochar desse setor.”
O empresário Abilio Diniz, outro profundo conhecedor do setor, concorda. “O mundo caminha em alta velocidade e a visão inovadora da Gouvêa contribui muito para a inovação em toda a cadeia do varejo, setor que necessita estar sempre atualizado em relação às necessidades dos consumidores. Minha empresa de investimentos, a Península, fez uma viagem à China, organizada pela Gouvêa, para conhecer mais sobre as companhias de lá e foi extremamente útil para todo o nosso time.”
Formalização e desenvolvimento do setor
Luiza Helena Trajano lembra que foi num jantar promovido pela Gouvêa durante uma edição da NRF que os líderes presentes perceberam a necessidade de criar uma entidade específica para o varejo, dando origem ao Instituto para Desenvolvimento do Varejo, o IDV.
Nessa época, em 2004, o varejo, apesar de já ser o maior empregador do Brasil, não tinha interlocutores diretos nos órgãos do governo. O instituto elegeu o combate à informalidade como prioridade, assim como a busca pelo desenvolvimento sustentável do setor. “Quando nos integramos, assumimos a tese de que não haveria desenvolvimento, globalização e maturidade com informalidade”, diz Marcos, membro do conselho da entidade. Hoje, o IDV reúne empresários e presidentes de algumas das maiores empresas do varejo do País.
Da mesma forma, foi por iniciativa da Gouvêa que foi criado, há uma década, o Instituto Foodservice Brasil (IFB), que integra a cadeia completa do foodservice, envolvendo indústrias, marcas, operadores e prestadores de serviços. O instituto nasceu com a missão de fortalecer e promover o setor de alimentação fora do lar no País e, para isso, realiza e divulga estudos que auxiliam as empresas e o mercado como um todo.
Desde 2001, a empresa integra o Ebeltoft Group, participando de seu conselho. O Ebeltoft é uma aliança global de consultorias focadas em consumo e varejo, com membros em 22 países em todos os continentes.
Além das áreas de consultoria, conteúdo e eventos – que desde 2020 conta também com Campus Party-, nos últimos anos a Gouvêa se fortaleceu como ecossistema incorporando empresas de pesquisa, treinamento, tecnologia e aceleração digital.
No aniversário de 35 anos, a Gouvêa Ecosystem espera crescer 110% em faturamento na comparação com 2019, o ano imediatamente anterior ao da pandemia de covid-19. O número de sócios dobrou de lá para cá. O modelo de ecossistema, acredita Marcos, faz mais sentido do que nunca.
“Nosso modelo, em processo de contínua evolução, consiste em buscar a integração virtuosa daquilo que é mais positivo em empresas de pequeno e médio porte, em termos de comprometimento, criatividade, alma, agilidade e envolvimento, com as virtudes de empresas maiores em termos de infraestrutura, investimentos, tecnologia, relacionamento e marca”, finaliza Marcos.
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