Gerente de produtos proprietários, especialista de food hall, coordenadora de onboarding e curadoria, especialista em produtos digitais, gerente de comunicação, diversidade e inclusão, coordenadora de marketing digital e e-commerce, supervisor de qualidade e analista de ambiência. Todos esses cargos não existiam, anos atrás, na estrutura dos shopping centers brasileiros. Hoje fazem parte do organograma da Allos, maior empresa do setor, no Brasil.
A parte mais visível das mudanças que afetam os centros comerciais brasileiros pode ser percebida na arquitetura, ambiente e mix de lojas. A inovação se faz presente nos projetos de canais digitais, programas de CRM, assistentes virtuais e tecnologias para aumento da eficiência e redução de custos. O que pouca gente tem comentado é como todas essas novidades estão modificando funções e exigindo novas competências dos que trabalham na indústria.
O resultado não pode ser medido apenas pela criação de novos cargos, mas também na atualização das responsabilidades das cadeiras tradicionais. “Há cinco anos, inovação e tecnologia não tinham a importância que possuem hoje. O negócio estava muito baseado no físico. Então, é natural que essas áreas tenham crescido. E os superintendentes também precisaram incorporar novas competências, como o mindset de inovação e de geração de negócios”, afirma Renata Correa, diretora de Gente e Performance da Allos.
Porém, enganam-se os que acham que tecnologia é o único elemento transformador no perfil de quem trabalha em shoppings. Para Renata, o maior desafio é a sensibilidade para entender aspectos humanos, envolvendo consumidores, colaboradores, lojistas.
Segundo Renata, a pandemia obrigou todo mundo a melhorar habilidades para desenvolver relacionamentos e entender mais as pessoas. “Durante o lockdown, tivemos que desconfiar menos do próximo e confiar mais nos outros”, exemplificou. Temas como saúde mental e qualidade de vida ganharam maior relevância entre os colaboradores. E soft skills viraram prioridade nos programas de treinamento esse ano, com destaque para assuntos como inteligência emocional e comunicação.
As modificações não se restringem à sede da empresa, é claro. A maior complexidade do mercado tornou essencial elevar a qualificação da estrutura na ponta, com as equipes que trabalham nos shoppings precisando ampliar a visão de negócio e compreender melhor os frequentadores. “A vida acontece nos shoppings. E entender o consumidor é entender o negócio”, resumiu Renata.
Novos indicadores, pouco controlados no passado, também entraram em cena. Ao lado das metas de NOI (receita operacional líquida) e Ebitda, aspectos como gestão de pessoas, nível de integração à cultura da companhia e diversidade, equidade e inclusão passaram a ser acompanhados de perto.
Como em todo processo de transformação, um dos principais desafios é gerenciar eventuais resistências. No caso da Allos, as dificuldades envolviam ainda a integração de times de duas empresas distintas, envolvidas em uma fusão rumorosa.
“Primeiro desenhamos a estrutura ideal. Depois procuramos colocar as pessoas certas, com as competências adequadas, nos lugares certos”, explicou Renata. Neste movimento, alguns mostraram-se propositivos, outros neutros, e houve quem apresentasse um comportamento reativo. Como agir nesse caso? “O caminho é explicar os benefícios da mudança”, ensinou. “Na dúvida, volte ao propósito”.
O caso da Allos é pedagógico, não apenas pelo tamanho da companhia, mas também porque a empresa pode desenhar um novo organograma, em função da fusão entre Aliansce Sonae e brMalls. Porém, discussões sobre tamanho e perfis de equipes estão sendo travadas, nesse momento, em shoppings de diferentes portes, por conta da evolução constante no modelo de negócio dessa indústria tão tradicional e bem-sucedida.
A sabedoria popular diz que não se faz uma omelete sem quebrar os ovos. Isso significa que shoppings continuarão a testar novas estruturas. E seus profissionais terão que correr para adquirir novos conhecimentos. Rápido.
Quem viver, verá.
Luiz Alberto Marinho é sócio-diretor da Gouvêa Malls.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo.
Imagem: Shutterstock