Com a ausência do El Niño, o clima no Brasil em 2024 trouxe uma nova dinâmica que deve impactar o mercado varejista. A volta das chuvas e as temperaturas mais amenas – bem diferentes do calor intenso registrado nesta mesma época de 2023 – marcam uma primavera mais úmida e fresca. Para este verão, a tendência deve ser semelhante.
Embora esse cenário traga benefícios consideráveis para setores como o agronegócio e a pecuária, o efeito sobre as vendas de itens sazonais de verão pode não ser tão positivo quanto ao observado em anos anteriores. Há de ser ter atenção para as estratégias de vendas de aparelhos de ar-condicionado e roupas e acessórios mais leves. Não por acaso varejistas já começam a replanejar a produção e os estoques de mercadorias para próximas estações de 2025.
Nos últimos dois anos, o clima aquecido em meses tradicionalmente frios prejudicou a comercialização de artigos sazonais. Casacos e botas, por exemplo, registraram vendas abaixo das expectativas. Em 2024, a primeira onda de frio chegou depois do Dia das Mães, limitando o impacto positivo no varejo. Agosto e setembro deste ano foram ainda mais desafiadores, com uma anomalia média de temperatura de 3 a 4 graus acima do normal, mantendo o ambiente desfavorável para os produtos de inverno.
Do ponto de vista meteorológico, as estações de 2023 e 2024 foram influenciadas pela presença do El Niño. Esse fenômeno, combinado às mudanças climáticas, causou aumento nas temperaturas em várias regiões. Além de reduzir o frio esperado, este padrão climático trouxe ondas de calor fora de época e padrões de chuva irregulares: excesso de precipitação no Sul, seca no Norte e Nordeste e temperaturas elevadas na região central.
O quadro que vivenciamos nos dois últimos invernos no Brasil reforça a importância de um planejamento cuidadoso para o setor varejista, que se vê desafiado a entender e antecipar as variáveis climáticas. Relembremos o boom de vendas de equipamentos de refrigeração, como ares-condicionados e ventiladores, fora de época.
Para produtos dessa natureza, a projeção é de crescimento devido às condições climáticas típicas do país. As atuais 36 milhões de unidades de ares-condicionados devem se multiplicar e chegar a 160 milhões em 2050, alta de quase 350%. A estimativa leva em conta o aumento do PIB feito recentemente pela Agência Internacional de Energia (AIE). No mundo, o salto será de 2 milhões para 5,5 milhões de aparelhos.
Uma pergunta-chave agora é: será que o inverno de 2025 trará temperaturas mais baixas, favorecendo o comércio sazonal do período com a possível formação de uma La Niña, mesmo que moderada? Estudos meteorológicos indicam que sim. A expectativa é de um clima um pouco mais favorável para 2025, sem os efeitos de aquecimento do El Niño. No entanto, outros fatores climáticos ainda precisam ser observados e o impacto deve variar entre as diferentes regiões brasileiras.
Essas incertezas climáticas colocam o varejo cada vez mais em um cenário desafiador. Portanto, é pertinente o uso de dados e estudos de inteligência para orientar as estratégias no mercado varejista e garantir um bom desempenho de vendas.
Alexandre Nascimento é sócio-diretor e meteorologista da Nottus.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo.
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