Em um dos meus artigos passados, comentei sobre o problema da desbancarização do consumidor brasileiro. Mais de 40% da população ainda se encontra sem qualquer tipo de conta no banco e muito longe dos hoje chamados “meios de pagamentos digitais”, o que torna o desafio de digitalização ou o crescimento do comércio digital mais difícil.
A iniciativa do Open Banking, anunciada pelo governo há alguns dias, não somente criará oportunidades, como poderá criar uma nova revolução no varejo brasileiro, ou como entendemos esse.
O Open Banking, entre outras coisas, irá possibilitar que o próprio consumidor gerencie a disponibilização de seus dados e permita que empresas de menor porte, como as startups, também ofereçam empréstimos e outros serviços a taxas que tendem a ser mais competitivas.
Nesse novo movimento, onde o consumidor empoderado se torna o centro das atenções, o varejo pode usar essa nova oportunidade como uma maneira de se tornar um super hub de serviços ao consumidor, sendo não somente a plataforma onde ele consome produtos, mas também onde poderá rodar boa parte do seu dinheiro.
É engraçado comparar o movimento que começa a tomar forma com algo que já conhecemos há muito tempo no país. Há mais de 70 anos, Silvio Santos iniciou sua fortuna com seu carnê, possibilitando que os clientes que fossem adimplentes pudessem, ao final das prestações, trocar os valores pagos por produtos nas lojas do Baú da Felicidade.
Embora o modelo do antigo carnê ainda esteja vigente (e com muito sucesso), podemos pensar que o varejo começará a oferecer plataformas muito mais elaboradas em termos de serviços, possibilitando que o consumidor até mesmo receba salários ou depósitos em uma conta criada e administrada por algum varejista.
Na prática, se antes a questão era ofertar dinheiro (crédito) para o consumo, parece que boa parte dos modelos que podem surgir irão para o sentido contrário, orientando o consumidor a poupar ou fazer alguma economia para comprar em modalidades pré-pagas.
Como exemplo, desde o final de abril, as Pernambucanas começaram a implantar seu modelo de conta/carteira digital, enunciando também a não necessidade de consulta ao sistema de crédito para a abertura. Na prática, a conta digital funciona como uma conta corrente, com direito a depósitos e saques nas redes 24h, ou na própria rede de lojas, que ganham vantagem por sua capilaridade. Toda a movimentação é pré-paga, são cobradas uma pequena mensalidade e algumas taxas de acordo com as operações realizadas.
No turbilhão de novidades que parecem que vão sacudir o varejo em pouco tempo, a oportunidade de se tornar banco já pode estar sendo discutida nas mesas de diretorias das maiores empresas do varejo brasileiro. Se o setor não vive sem crédito, é bem verdade que se tornar um banco e cortar algum dos intermediários pode ser algo extremamente vantajoso em termos financeiros. É apenas uma questão de (pouco) tempo para vermos como o varejo e o consumidor brasileiro vão se adaptar a essa nova realidade.
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