Sabemos mesmo para onde estamos caminhando como nação? Temos a tendência de olhar as transformações na perspectiva de curto e, quando muito, médio prazo. Mesmo quando se trata das mais complexas, que são as precipitadas pela tecnologia. É quase que um mecanismo de defesa para não sairmos de nossa zona de conforto.
Se olharmos nessa anêmica perspectiva de curto e médio prazos, o cenário está se desenhando como se imaginava.
A economia mostra uma resiliência histórica e traz alguns resultados melhores do que as pessimistas previsões anteriores. Puxado pelo setor agro, o desempenho econômico surpreende: cai o desemprego, a renda real aumenta um pouco, a inadimplência das famílias se estabiliza e tende a reduzir, a inflação cede e mostra que a cautela com as taxas de juros trouxe resultados.
E as elevadas taxas reais tenderão a ser reduzidas num horizonte de curto e médio prazo. E, por fim, a confiança do consumidor mostra tendência de melhoria.
Para contribuir, as agências de classificação de risco, como S&P e Moody’s, valorizam e reconhecem o trabalho realizado e os resultados dos últimos anos, e não meses, no combate e controle da inflação e na melhoria do cenário econômico.
Permaneceremos, porém, nos anêmicos 1,8% de média anual de crescimento econômico, que caracterizam os últimos 20 anos do Brasil, com pouco ou nenhum avanço na redução da desigualdade social, na melhoria significativa da educação, na redução da pobreza, na melhoria da segurança e outros temas fundamentais.
Não temos um projeto transformador para a nação, apesar do incrível avanço do setor agro e seu destaque global e de algumas empresas nacionais serem líderes mundiais em suas áreas de atividade, como JBS, Inbev, Ewg, Tramontina, Embraer, Natura, Boticário, Gerdau, entre outras. E de termos um dos mais avançados, estruturados e sólidos sistemas financeiros do mundo.
Apesar de tudo isso, não somos capazes de erradicar nossos problemas sociais mais sérios, com avanços relevantes na saúde da população, de elevar a educação média de maneira consistente e oferecer saneamento de forma ampla. Para listar o mínimo do básico.
Apesar de ricos pela abundância de nossos recursos, ideias e capacidade de inovar, somos pobres em nossa competência para disseminar o que poucos conquistaram e têm em comparação com a grande massa que pouco consegue em educação, saúde e oportunidade.
Enquanto setores empresariais privados como o agro e o financeiro, modelos do pensamento estratégico e de resultados em escala global pensam com a lógica do curto, médio e, principalmente, longo prazos, o País e a maioria dos outros setores pensam com a ótica do curto e médio prazos apenas.
Qual é o nosso projeto para a nação nos próximos 50 anos?
Qual o projeto para a transformação estrutural e social que precisa ser feita considerando nossos potenciais, vocações, diferenciais e recursos, ante um mundo em profunda, ampla e relevante transformação geopolítica, econômica, tecnológica e social?
Simplesmente não temos. E assim estamos há pelo menos 40 anos.
E que não se espere de governos movidos pelas ações políticas de curto e médio prazo um pensamento ordenado, integrador e ambicioso para a nação.
Ou pensamos estrategicamente um projeto para o Brasil ou continuaremos a viver dos sobressaltos da política e da economia com visão imediatista, deixando de capitalizar o muito que temos como sociedade, como país e como nação.
Se isso não acontecer, vamos ter que nos conformar em incensar os que conquistam espaço e crescem em âmbito global por sua competência, porém, vivendo e nos isolando cada vez mais em bolhas sociais, ambientais ou espaciais, pois o entorno nos assustará. Ou nos envergonhará.
E continuar esperando um salvador da pátria com o poder mágico de tudo transformar nos levará ao que temos repetido: mais do mesmo e as oportunidades sendo perdidas.
Cremos que o único caminho que possa reverter esse fatalismo existencial seja o setor empresarial, pensando de forma integrada e despojada para se engajar na coordenação, proposição e implantação de um projeto para a nação. Como faz em suas próprias atividades privadas.
Vale refletir. E muito.
Nota: Esses elementos que impactam a transformação do varejo e do consumo serão apresentados e debatidos para os mais diferentes canais, categorias, formatos e modelos de negócios no Latam Retail Show, tendo como tema central “Back to the Future”, de 19 a 21 de setembro em São Paulo.
Marcos Gouvêa de Souza é fundador e diretor-geral da Gouvêa Ecosystem e publisher da plataforma Mercado&Consumo.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo.
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