Já perdi as contas de quantos clientes chegaram até mim em busca de uma solução para motivar e engajar o time. E a visão sobre o que é motivação são as mais variadas possíveis. O mais comum é querer realizar um treinamento pontual ou uma palestra, esperando que os colaboradores saiam de lá extremamente motivados para entregar mais, melhor e transformar positivamente seus resultados.
Quando não há um ambiente motivador na empresa como parte de sua cultura, sendo estimulado constantemente pelas lideranças, esse tipo de ação até funciona, mas a “motivação” é momentânea, fruto daquele encontro. Logo se esvai e se perde, imersa em uma rotina pouco estimulante para a sustentação do resultado esperado.
Antes explicar como criar uma cultura que motive seus colaboradores a manter uma entrega de alta performance, é necessário entender que existem dois tipos de motivação: a intrínseca e a extrínseca. Eu explico um pouco mais sobre elas nesse artigo “Como eu faço para ter uma equipe mais motivada?”
É verdade que cada indivíduo é o principal responsável por construir a sua motivação intrínseca e que ela pode receber influência de diversas esferas da vida, não só as relacionadas ao trabalho. Quando um indivíduo tem elementos constantes em sua rotina que alimentam seus gatilhos motivacionais, ele se sente mais disposto e realizado com uma frequência maior, gerando a tão desejada felicidade, inclusive no trabalho.
Mas qual o papel das empresas nesse processo e qual a parcela de colaboração que o trabalho pode ter na motivação intrínseca de alguém? Tudo vai depender de qual peso a pessoa atribui à “esfera do trabalho” em comparação às outras esferas da vida dela: espiritualidade, saúde e disposição, desenvolvimento intelectual, equilíbrio emocional, finanças, propósito e contribuição para a sociedade, amizades e família, afetividade e amor, vida social, hobbies e diversão.
E as realizações pessoais são outras esferas da vida e todos nós, consciente ou inconscientemente, atribuímos um peso de importância para cada uma delas. Tendemos a escolher uma delas para usar de alicerce principal, impactando em todas as decisões pessoais e percepção de felicidade de uma forma geral. Já parou para pensar quantos de seus colaboradores colocam a esfera do trabalho como seu alicerce principal e o quanto isso impacta na percepção de felicidade e propósito de vida dele?
A partir de diretrizes claras e objetivas que conduzam as ações de todos, tendo principalmente as lideranças como exemplo, é possível criar um ambiente propício para as pessoas se sentirem mais abertas a falar, contribuir, crescer e pertencer. Isso faz com que se sintam mais felizes e produtivas, aumentando seus níveis de motivação intrínseca por causa do trabalho.
Veja quais são os quatro elementos principais que precisam fazer parte da cultura da empresa para que você possa criar um ambiente que estimule a motivação intrínseca de seus colaboradores:
Ser ouvido
Escutar o que realmente alguém está dizendo é um exercício físico e mental. Ele exige que você viva inteiramente o momento presente e mantenha seu foco 100% na pessoa com o qual está se comunicando.
Na rotina acelerada ao qual estamos imersos hoje muitas vezes, acabamos respondendo uma mensagem durante uma reunião ou realizando alguma outra atividade rápida e pontual com o objetivo de ganhar tempo.
Entretanto, o cérebro possui uma dificuldade imensa de realizar atividades simultaneamente e o nosso foco fica comprometido. Além disso, você constrói barreiras durante a comunicação com a outra pessoa, prejudicando seus pontos de conexão com ela. A escuta ativa precisa fazer parte da cultura da empresa. Só assim é possível passar para o próximo passo.
Ter a opinião respeitada
Todos nós temos a própria opinião sobre a coisas. Somos seres plurais, com diferentes experiências, conhecimentos, percepções e culturas próprias (afinal, a cultura do colaborador vai além da cultura da empresa. Ela é formada pelo ambiente em que cresceu, onde vive, onde já viveu, pelas pessoas com as quais convive e as escolhas que toma para si).
Respeitar a opinião de alguém não é renunciar à sua própria, mas simplesmente respeitar toda a história de vida do outro. Isso é exercitar a empatia, colocando-se no lugar do outro sem se envolver nas escolhas ou deixar-se mergulhar nos sentimentos dele. É ter inteligência emocional para se relacionar com os outros e com você mesmo.
Respeitar a opinião do outro não elimina a importância de analisarmos fatos baseados em dados, tão fundamental para qualquer relação de negócios. É saber conduzir a conversa para chegar a um denominador comum em prol dos resultados da empresa.
Perceber que contribui ao mesmo tempo em que aprende
Nessa parte de troca e empatia, respeitando as vivências, experiências e conhecimento de cada um, você cria um ambiente saudável e propício para o aprendizado. Isso pode ser intensificado com programas e ações formais da empresa, onde cada colaborador, de forma estruturada, contribua para a formação e desenvolvimento dos demais.
Com esse tipo de condução, as pessoas se sentem valorizadas e buscam conhecimento constantemente, a fim de aprimorar suas competências e habilidades e alimentar esse ciclo virtuoso de contribuição dentro da empresa.
Cada indivíduo constrói o seu próprio sistema de crenças: algumas são positivas e estimulam o crescimento; outras crenças podem causar insegurança e impedir a pessoa de trabalhar no seu crescimento pessoal e profissional.
Mas isso não se torna um impeditivo de desenvolvimento quando o ambiente é propício e seguro para o aprendizado, estimulando o Life Long Learning (termo em inglês para definir o conceito de “nunca parar de aprender ao longo da vida”). Tal conceito, quando praticado como parte da cultura corporativa, fomenta o sentimento de pertencimento e propósito do colaborador, estreitando os sentimentos de vínculo com a empresa.
Colher resultados para um propósito maior
É fundamental contratar pessoas que compartilhem do mesmo propósito que a empresa. Esse ponto de conexão pode ser um elo poderoso para o engajamento e motivação do colaborador e excelente oportunidade para fortalecer o seu propósito no mercado, especialmente em tempos em que a pauta ESG tem ganhado cada vez mais força no Brasil e no mundo. Pesquisas apontam que 95% das empresas brasileiras já entendem a sua importância e 48% dos CEOS tem o tema como prioridade máxima.
Além disso, praticar o bem e sentir que seu trabalho colabora para o benefício e crescimento do próximo aumenta os níveis de felicidade no trabalho. O tema, inclusive, foi apresentado no Globo Repórter do dia 28 de julho, mostrando como a gentileza está sendo trabalhada no ambiente corporativo.
Mas é preciso envolver todos os colaboradores para esse propósito maior, dando a oportunidade de contribuir e pertencer. As ações que impactam no propósito da empresa não podem ser isoladas ou responsabilidade de um setor específico.
Todo esse trabalho começa com a definição das estratégias da empresa e como essa estratégia está sendo aplicada entre os colaboradores. A cultura é um organismo vivo que está em constante crescimento e transformação e precisa estar sedimentada em bases fortes para se manter saudável e sustentável.
Roberta Andrade é gerente de Soluções da Friedman.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo.
Imagem: Shuttersrtock