Antes de embarcar para a NRF, escrevi um artigo com o que poderíamos encontrar por lá, segundo as informações divulgadas pela organização do evento. Mas, além do congresso e da feira, incluo aqui alguns recortes complementares oriundos das visitas, de observações e experiências pessoais vividas com a Delegação da Gouvêa Experience.
Este ano, realmente, a estrutura desenhada para o foodservice na área de expo da NRF surpreendeu em tamanho e em soluções. Muitos sorrisos foram arrancados das pessoas que viam, pela primeira vez, braços robóticos ou robôs preparando batatas fritas ou pizzas. Soluções bastante divulgadas para quem atua no segmento, que circulam há algum tempo e também foram vistas, em 2023, na NRA Show. Porém, sempre geram impacto pelo fato de ainda não estarem amplamente implementadas.
Uma área de drive-thru com um fluxo ilustrado foi montado em tamanho real, etapa a etapa, cujo diferencial era o monitoramento das reações, da velocidade do tráfego e a antecipação da tendência de, no futuro, a pessoa pagar diretamente do seu carro com aplicativos das próprias montadoras. Hoje, no Brasil, já podemos pagar com nossos aplicativos de pagamento automático de pedágio e estacionamento.
Minhas soluções favoritas foram:
- Eliminação de aplicativos para abertura de portas de soluções autônomas, geladeiras, expositores ou lojas. Sim! Usando o seu cartão de crédito. Era inserir, ser reconhecido, fazer suas compras e fechar o dispositivo ou sair do ambiente. Essa solução já está operante em lojas Amazon Go da cidade. Uma percepção real de frictionless (sem atrito) para o consumidor, uma vez que baixar mais um aplicativo não é agradável. E é possível rastrear a jornada pelo cartão a partir das soluções de “trackeamento” entregues pelo unified commerce.
- Visão computacional para checkout. Esse, achei espetacular! O cliente escolhe o que quer que seja em sua bandeja, cesta ou coloca simplesmente os itens na respectiva área de checkout e os produtos são reconhecidos, registrados e o pagamento pode ser feito com cartão de crédito ou com a palma da mão. Não é código de barras, não, é RFID, é a evolução do equipamento para leitura do produto em sua massa, cor, profundidade, etc.
- Dispositivos de varejo aplicados ao foodservice. Esses, eu destaco bem envaidecida porque, em 2022, apresentamos no Latam Retail Show um protótipo de restaurante do futuro com algumas dessas tecnologias, que são extremamente comuns no varejo, mas ainda pouco acessadas pelos negócios de foodservice. Contadores de tráfego, câmeras para avaliação da expressão fácil, identificação de sexo e idade, sensores de temperatura para identificar áreas de aglomeração e, portanto, de sucesso ou gargalo, superinteressantes para quem tem expositores de produtos ou, no caso de uma área de foodhall, permitir a revisão do fluxo.
- Câmeras para validação de planograma ou abastecimento. Câmeras integradas a buffets ou gôndolas permitiam a identificação e o cruzamento com os padrões previstos, sinalizando a conformidade – muito bom para redes -, além do monitoramento que poderiam sinalizar a necessidade de abastecimento.
Outras soluções também foram apresentadas, como robôs para organização de estoque, robôs para contagem de inventário, contudo, o fato é que todas as soluções tecnológicas respondiam à necessidade de aumento de eficiência operacional. Algumas bem perceptíveis aos clientes, outras invisíveis ou pouco perceptíveis, mas todas permitindo a adição de inteligência artificial para assegurar um processo de melhoria contínua. O que é realmente fascinante e aumenta a responsabilidade dos gestores do segmento em relação à integração com as tecnologias.
Ainda fechando esse capítulo da feira, tem aquelas coisas superdivertidas, como uma vending machine para hot dog, que mantém a salsicha refrigerada, aquece, coloca no pão, entrega em uma caixinha e dispensa os sachês de catchup e mostarda se o cliente demandar. Charmosa? Bonita? Não! Mas entregando o básico perfeito, talvez até mais eficiente do que em uma operação tradicional. Me pareceu fazer bastante sentido para aeroportos ou terminais rodoviários.
Neste ano, um pano de fundo de conteúdo da NRF foi o luxo. E luxo no foodservice tem a ver com ingredientes, técnica perfeita, paixão e estilo de vida. A tecnologia existe como plataforma, mas o que destaca uma operação incrível é a perfeição em toda a jornada do cliente.
O CEO da Moët Hennessy, Philippe Schaus, apresentou o olhar estratégico da empresa, como atua nos diferentes mercados, mas sublinhou o fato de que cuida para que os produtos se mantenham como objetos de desejo e se integrem ao estilo de vida de pessoas para que inspirem seus consumidores. Tudo ilustrado com campanhas de marketing digitais e offline que realmente fazem as pessoas sonharem. Ele usou uma frase: “as pessoas estão bebendo menos, mas estão bebendo melhor.” Bem provocativo em um mundo onde estamos sempre discutindo preço.
O luxo também precisa ser altamente sustentável. O tema de resale (revenda) permeou muitas discussões, já que ele dá voz e solução à preocupação do consumidor com a sustentabilidade, inclusive, desconectando-se de marcas que não atendam a essa perspectiva. Visitamos o case da marca “The Real Real” e vimos o quanto plataformas como Amazon, Walmart e até o Alibaba já possuem produtos remanufaturados e com garantia.
É bem complexo imaginar qualquer alternativa de resale no foodservice devido à perecibilidade dos alimentos, mas existem múltiplas iniciativas no Brasil para mitigação do desperdício seja por meio de ofertas de oportunidade e monitoramento seja por meio de doações, inclusive, promovidas em uma cartilha incrível desenvolvida pelo Instituto Foodservice Brasil. Entretanto, o foodservice tem uma cadeia longa, que começa no campo e, para fazer um paralelo aplicado ao nosso segmento, destaco o programa lançado pela Pepsico, em 2021, que se chama Pep+.
Segundo Steve Williams, CEO da Pepsico North America, o Pep+ tem o objetivo de promover ações que gerem a melhor combinação entre pessoas e planeta, levando-os em 2040 a serem a indústria de alimentos mais sustentável do mundo. E, para isso, ele apresentou o case integrado entre o Walmart (parceiro de muitas iniciativas) e o United States Department of Agriculture (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos), cujo foco é reduzir o consumo de água no plantio, tornando as fazendas ainda mais eficientes em seus processos de produção e gerando produtos fornecidos para a Pepsico e para o Walmart com redução do impacto ambiental desse elemento tão precioso que é a água.
Vou encerrar esse artigo trazendo alguns pontos ligados à experiência. Eu, particularmente, não sou fã de alguém “gritar” o meu nome para retirar um pedido, sobretudo, em um lugar gostoso e especial. Quando em NY, sempre que posso, vou a Starbucks Reserve, ao lado do Chelsea Market, e esse é um rito da marca. Eles evoluíram, no entanto, entregando pagers aos clientes que falam bem mais baixo. Ufa! Ao pegar o meu café, recebi um card com informações sobre a bebida que eu tinha solicitado. Amei! Virou uma lembrança da viagem e me trouxe cultura e conexão.
Ainda falando sobre conexões, na Starbucks eu primeiro paguei e depois retirei. Em minha ida no Eataly Flatiron, primeiro consumi no restaurante e a conta veio ao final. Cabe ressaltar a estrutura muito viva, bem frequentada em termos de tráfego e muita oferta de produtos to go para consumo imediato e
to go para finalizar em casa. Quantas lasanhas lindas.
Voltando ao caso, quando recebi a conta, junto tinha um card com uma receita de um spaghetto al pomodoro. Foi a primeira vez que aconteceu em um Eataly (conheço o de Milão, Chicago, SP e NY) e eu fiquei tão animada com esse estímulo off line.
Me deu uma vontade imensa de cozinhar e tirou minha atenção do atrito que é o pagamento de uma conta. Talvez você se pergunte. Ela não estava ali há pouco destacando a tecnologia? Valorizando conceitos de sustentabilidade? Se encantando com inteligência artificial, estratégias de marketing… Como esses cartõezinhos fizeram tanta diferença?
Porque sou human obsessed (apaixonada por pessoas). Mas esse tema fica para outro artigo para complementar a visão da NRF 2024!
Cristina Souza é CEO da Gouvêa Foodservice.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo.
Imagem: Cristina Souza