Não há dúvidas de que nos últimos 5 anos todo o varejo e, na verdade, toda relação de consumo sofreram uma enorme transformação acelerada pela pandemia. Os modelos tradicionais estão buscando novas formas de chegar até seus clientes e de melhorar o relacionamento. Ao mesmo tempo, a competitividade aumenta, os canais de relacionamento e vendas se diversificam. Com isso, torna-se imperativo ter uma operação mais leve e eficiente. Dentro desse contexto, me diga, de 5 anos para cá, o que mudou na sua forma de comprar seu hamburguer preferido?
Setor de alimentação: foco em melhorar a eficiência e proposta de valor para o cliente
Faço aqui um breve recorte do setor de alimentação e fast-food, com três exemplos de empresas que estão se movimentando de maneiras distintas. Porém, todas estão trabalhando a análise de dados com foco no cliente para construírem uma oferta mais customizada, uma melhor interface digital com menos fricção (UX) e também a otimização de processos internos, tornando sua operação de loja menos complexa, mais eficiente, com menos tempo e custos menores.
Burger King
Durante o Websummit Rio, Ariel Grunkraut, CEO da Zamp, responsável pela operação do Burger King no Brasil, relatou que houve uma mudança significativa em direção às vendas digitais, com impressionantes 50% de todas as transações conduzidas pelos canais digitais.
Há 5 anos, a busca da empresa por estabelecer conexões mais fortes com seus clientes a levou a embarcar em uma jornada transformadora. Inspirada em modelos bem-sucedidos orientados por dados em indústrias, como bancária e de entretenimento, o Burger King reconheceu o potencial dentro do cenário varejista. A empresa estava determinada a elevar a experiência para seus clientes.
Essa transição alterou fundamentalmente a maneira como o BK se envolve com seus clientes, já que as interações tradicionais “olho no olho” foram substituídas por experiências de aplicativos e serviços de entrega. Surpreendentemente, os clientes abraçaram essa mudança, mostrando uma preferência por interações digitais em relação aos métodos promocionais tradicionais. Reconhecendo essa tendência, o Burger King embarcou em uma jornada de transformação, convertendo suas lojas para “100% digitais”.
Por meio da digitalização do relacionamento com seus clientes, na construção de programa de fidelidade, o BK construiu um caminho de conversa direta com clientes, em que a empresa pode fazer perguntas, observar atitudes e respostas, ajustando, assim, sua operação, personalizando suas ofertas e se tornando mais eficiente.
O Burger King viu seu custo de aquisição de novos clientes reduzir cerca de 70%, podendo reinvestir na operação e no marketing. Ao aproveitar dados e insights brutos, a empresa se esforçou para personalizar interações e dimensionar seus esforços para acomodar o impressionante influxo de 150 milhões de clientes anuais em suas lojas.
Chipotle
A Chipotle, conhecida pelos seus tacos e burritos, tem atualmente quase 3.200 restaurantes espalhados por Estados Unidos, Canadá, Reino Unido, França e Alemanha.
A Chipotle adotou uma abordagem única ao priorizar a experiência física no restaurante como o principal impulsionador da satisfação do cliente, diferenciando-se de concorrentes como o McDonald’s e o Wendy’s, que estão predominantemente focados em alavancar dados de fidelidade e aprimorar experiências digitais.
No último report trimestral da companhia, o CEO da empresa, Brian Niccol, enfatizou a importância da eficiência nas lojas. Ele vê isso como um ingrediente essencial para uma experiência do cliente excepcional, afirmando que uma boa operação de loja “é uma daquelas coisas que faz com que tudo fique muito melhor”.
A tecnologia implantada dentro da loja, desempenha um papel fundamental no aprimoramento de sistemas de pedidos digitais com lembretes de retirada dos pedidos. As prioridades imediatas incluem a capacitação dos atendentes da linha de frente para aprimorar a eficiência no atendimento. Para evitar o desperdício e melhorar a gestão de seus estoques, a empresa vem desenvolvendo ferramentas automatizadas na produção de seus alimentos, embora essas inovações possam levar tempo para se materializar.
KFC Brasil
A International Meal Company (IMC), proprietária das marcas KFC, Pizza Hut e Frango Assado, enfrentou desafios significativos devido à pandemia, incluindo o fechamento de unidades e a necessidade de reestruturação financeira. Em entrevista recente à CNN, Alexandre Santoro, CEO da IMC, explicou que, com a redução de tráfego em shoppings e nos cinemas, a rede está revendo sua estratégia de atuação, com a diversificação dos pontos de suas lojas, privilegiando lojas de ruas, com oportunidade de drive-trhu e dando maior foco ao delivery.
No caso específico da KFC, a pandemia acelerou o delivery, que até então não existia. A KFC teve que repensar a loja para o delivery. A rede tinha poucas lojas localizadas prioritariamente dentro de shoppings – com a expansão, a rede passou de 70 para 200 lojas, mudando o perfil de investimento, priorizando a abertura de lojas de rua com drive-thru para dar agilidade no processo de delivery.
Como resultado, as vendas pelos canais digitais já passam de 30%, incluindo o delivery e as vendas nos totens de autoatendimento instalados dentro das lojas. Isto é, não basta abrir um canal digital de delivery, ou simplesmente entrar em um agregador de pedidos como iFood ou Rappi. A sua loja e sua operação devem estar adequadas para atender esse perfil de pedido.
Para uma melhor experiência neste canal, a empresa deve se questionar como funciona toda a jornada do delivery. Quais são os ajustes nos processos internos e no treinamento das pessoas para atender esse tipo de demanda? Como ter o menor impacto no atendimento das lojas e na experiência de quem optou por comer dentro do restaurante?
A pandemia intensificou transformações que já estavam em curso nos negócios e nos hábitos dos clientes e consumidores. Os ciclos estão cada vez mais curtos, exigem uma rápida adaptação das marcas para se manterem próximas de seus clientes, com ofertas cada vez mais personalizadas, estimulando a retenção e fidelidade e por meio dos dados gerados pela digitalização, além de melhorar sua eficiência operacional.
Para se manterem competitivas, essas diferentes marcas estão buscando formas de ouvir seus clientes por meio de todos seus canais de relacionamento, consolidando os dados com a oportunidade de levar essas informações de maneira estruturada para a companhia, ajustando suas ofertas de acordos com suas preferências.
Estes exemplos mostram que a tecnologia é o meio para a transformação dos negócios. Porém, mais importante do que seguir as palavras da moda, mais do que falar que está usando Inteligência Artificial no seu negócio, é preciso entender a jornada de seu cliente como um todo e ajustar sua operação.
A melhor solução não é uma receita única para cada negócio. As lojas devem estar prontas para operar uma demanda de delivery, suas equipes treinadas para atender um novo perfil de cliente e seus produtos e ofertas adequadas a cada perfil de cliente. Fundamental trazer a visão de fora (do cliente) para direcionar os ajustes operacionais.
Alexandre van Beeck é executivo de CX, Inovação, Estratégia e Negócios.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo.
Imagem: Shutterstock